segunda-feira, 3 de junho de 2013

Homem como ser político


O que pensam os estudantes sobre a palavra política?

Como essa palavra é muito presente em nosso cotidiano, certamente você já a ouviu ou já pensou nela com diferentes significados.
Frase  1: O voto não deveria ser obrigatório, porque eu nem gosto de política; por que tenho de ir votar?
Frase 2: O Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) é uma política pública que pode ajudar na mudança dos sistemas de ingresso ao Ensino Superior.
Frase 3: A participação política favorece a escolha dos melhores candidatos aos cargos legislativos e executivos.
• Conversando com seus colegas, discuta os diferentes significados da palavra política em cada uma das frases.
• Depois, registre individualmente um texto sobre a presença da palavra política em sua experiência de vida, em uma folha à parte.
Como teria surgido a referência à política na história da Filosofia?
A origem etimológica da palavra localiza-se no grego antigo e traz polittique e politikós, sugerindo arte de governar a cidade e aquele que é da cidade. Em Platão e Aristóteles, a palavra política está associada à vida na cidade.
Um dos diálogos de Platão (428 a.C.- 347 a.C.) apresenta uma das teses mais antigas sobre a arte da política. Além de antiga, ela tornou-se um marco na história da Filosofia. O diálogo chama-se Protágoras, e a tese sobre a virtude política encontra-se no trecho que ficou conhecido como o Mito de Protágoras.
Um jovem chamado Hipócrates pede que Sócrates o apresente a Protágoras (480 a.C.-410 a.C.) na esperança de tornar-se seu discípulo, por quem tem grande admiração. Sócrates leva Hipócrates a uma reunião, na qual Protágoras se exibe para uma pequena platéia de atenienses.
A seguir, um resumo da primeira parte do diálogo.

Protágoras
Sócrates: Vou começar, Protágoras, pela finalidade da nossa visita. Hipócrates, aqui presente, deseja entrar para a tua escola e diz que gostaria de conhecer as vantagens que obteria com teu ensino. Eis tudo o que temos a dizer.
Protágoras: Meu jovem, a vantagem que obterás com minhas lições é que, depois de passares um dia comigo, voltarás para casa melhor do que eras; no dia seguinte a mesma coisa, e assim, todos os dias farás progressos, sempre para melhor. Sócrates então pede que Protágoras seja mais preciso na sua resposta e este acrescenta: “Eu só ensino a meus discípulos a ciência que eles procuram; esta ciência é a prudência, que lhes ensinará, nos negócios domésticos, a melhor forma de administrar a própria casa, e nos negócios da cidade (pólis) os tornará melhores para agir e falar por ela”.
Sócrates: Terei compreendido bem tua explicação? Referes-te então à arte política e dedicas-te a formar bons cidadãos?
Protágoras: Isso mesmo, Sócrates; esta é a ciência à qual me dedico.
Sócrates, então, passa a questionar Protágoras sobre a real possibilidade de se ensinar a virtude da mesma forma como se ensinam outras artes, como a da medicina, ou a de tocar flauta, e desafia Protágoras a demonstrar que ensinar a arte da política é, de fato, possível.
Protágoras: Pois bem, Sócrates. Mas, o que preferes? Que faça a minha demonstração contando uma fábula, como um avô conta histórias aos netos, ou discutindo a questão, ponto por ponto? Como os presentes ao diálogo responderam que Protágoras tratasse a questão como preferisse, Protágoras responde: “Parece que contar a fábula será mais agradável para todos”.
E, assim, passa a contar o que se tornou célebre como o “Mito de Protágoras”.

Eis um resumo da história:
[...] Os deuses haviam terminado a criação das várias criaturas (animais) do mundo. Mas ainda tinham que dar-lhes vida. Para tanto, chamaram dois irmãos – Prometeu e Epimeteu – para realizarem a seguinte tarefa: distribuir os dons para as diversas espécies, de maneira equitativa para que se garantisse que uma espécie não acabasse por destruir a outra. Epimeteu convence o irmão a deixá-lo fazer a distribuição dos dons e depois chamar Prometeu para conferir a obra. Epimeteu fez a partilha, dando a uns a força, e não a velocidade; a outros, a velocidade, mas não a força; deu recursos a alguns, e não a outros, a quem doou outros meios de sobrevivência. [...] Estes cuidados visavam evitar a extinção de cada raça.
Quando Prometeu veio examinar a distribuição dos recursos, viu as várias criaturas bem providas de tudo, enquanto o homem encontrava-se nu, descalço, sem proteção ou armas. Sem saber o que fazer, roubou dos deuses o domínio do fogo e das artes e presenteou-o ao homem. Assim, o homem ficou com as técnicas para se conservar vivo, mas sem a arte da política.
Por estes favores aos homens, parece que Prometeu foi severamente punido mais tarde. Com o que tinha, o homem articulou a linguagem, construiu casas, inventou a agricultura.
Mas, isolados, continuavam frágeis diante dos perigos da natureza. E, quando procuravam reunir-se em segurança, fundando cidades, faziam mal uns aos outros, pois não tinham os saberes da política, e assim, se dispersavam e acabavam por morrer.
Então, Zeus, temendo que a nossa espécie se extinguisse, encarregou Hermes de levar aos homens os dons do pudor e da justiça como norma para a convivência a ligar os homens pelos laços da civilidade.
Depois de estabelecer que o pudor e o senso da justiça fossem repartidos a todos os homens sem exceção, ordena que, em seu nome, todo homem incapaz de pudor e justiça ‘seja exterminado como se fosse uma peste na sociedade’.
E assim, a humanidade sobreviveu e progrediu. Em seguida, Protágoras apresenta seus argumentos, tratando a questão ‘ponto por ponto’. Afirma que, em relação às artes, concorda que os profissionais não admitam que amadores dêem palpite. ‘Mas, quando se delibera sobre política, que se apóia no senso da justiça e na temperança, é adequado admitir todo o tipo de gente a opinar. Pois é necessário que todos tenham parte na virtude da civilidade. Senão, não poderia existir a cidade. ’
Depois, quanto à possibilidade de se ensinar a virtude política, oferece outros argumentos: ‘No ensino da virtude, a tarefa dos pais começa desde os primeiros anos e estende-se até a morte [...]. Cada ato, cada palavra serve de ocasião para uma lição: ‘Isto é justo, dizem-lhe, aquilo injusto; isto é belo, aquilo é vergonhoso; isto agrada aos deuses, aquilo desagrada; faça isto, não faça aquilo’. [...] Depois, os pequenos são mandados à escola [...]. Ali conhecem as muitas normas, muitas histórias de louvor aos heróis antigos. É que se espera que a criança os imite e busque se assemelhar a eles. ’
‘Pelo fato de todos ensinarem a virtude, cada um na sua oportunidade, parece que ninguém a ensina. É o mesmo que se dá ao procurar um professor específico para ensinar a falar o grego (nossa língua materna). Não existe tal professor. ’
Depois da exposição da fábula e dos argumentos, Sócrates vira-se para o candidato a discípulo de Protágoras e exclama: “Hipócrates, filho de Apolodoro, como agradeço me fazeres vir a este encontro! Por nada no mundo trocaria o prazer de ter ouvido este discurso de Protágoras”.

Reflexão a partir da leitura
1. Qual é a ciência apontada por Protágoras para bem administrar a vida doméstica e a vida nas cidades?
2. Além dessa, ou a complementá-la, quais as outras condições para o exercício da boa convivência nas cidades?
3. De que forma essas condições se complementam? Apresente exemplos cotidianos.
4. Protágoras afirma, no diálogo, que a política assim concebida é algo possível de ser ensinado. O que você pensa a respeito? As virtudes destacadas no diálogo apresentado podem ser ensinadas?

Um debate muito polêmico
A partir de subgrupos, converse sobre as respostas das atividades anteriores e prepare um debate sobre a solução indicada no mito narrado por Protágoras, a saber, a ordem de Zeus para que todo homem incapaz de pudor e justiça fosse exterminado como uma peste na sociedade.
Como o seu grupo se posiciona a esse respeito?
Ao final do debate, registre as principais conclusões do grupo.

Política como parte da natureza humana
Este texto é importante para o contato com a contribuição de Aristóteles (384 a.C.-322 a.C.), que escreveu uma obra denominada Política, organizada em oito livros. Destacamos o Livro primeiro para leitura, pois nele, o autor defende a ideia de que a política integra a natureza humana, decorrente de outras características, também definidoras da espécie humana, que são o dom da fala e a necessidade de associação para além do núcleo familiar, constituindo as vilas, as cidades, os Estados.

Política
“[...] Se as primeiras comunidades são um fato da natureza, também o é a cidade, porque ela é o fim daquelas comunidades, e a natureza de uma coisa é o seu fim: aquilo que cada coisa se torna quanto atinge seu completo desenvolvimento, nós chamamos de natureza daquela coisa, quer se trate de um homem, de um cavalo ou de uma família.
Além disso, a causa final e o fim de uma coisa é o que é o melhor para ela; ora, bastar-se a si mesma é, ao mesmo tempo, um fim e um bem por excelência.
Essas considerações tornam evidente que a cidade é uma realidade natural e que o homem é, por natureza, um animal político. E aquele que, por natureza e não por mero acidente, não faz parte de uma cidade é ou um ser degradado ou um ser superior ao homem [...] um tal homem é, por natureza, ávido de combates, e é como uma peça isolada no jogo de damas. É evidente, assim, a razão pela qual o homem é um animal político em grau maior que as abelhas ou todos os outros animais que vivem reunidos. Dizemos, de fato, que a natureza nada faz em vão, e o homem é o único entre todos os animais a possuir o dom da fala. Sem dúvida os sons da voz exprimem a dor e o prazer e são encontrados nos animais em geral, pois sua natureza lhes permite experimentar esses sentimentos e comunicá-los uns aos outros. Mas quanto ao discurso, ele serve para exprimir o útil e o nocivo e, em consequência, o justo e o injusto. De fato, essa é a característica que distingue o homem de todos os outros animais: só ele sabe discernir o bem e o mal, o justo e o injusto, e os outros sentimentos da mesma ordem; ora, é precisamente a posse comum desses sentimentos que engendra a família e a cidade.
A cidade, portanto, é por natureza anterior à família e a cada homem tomado individualmente, pois o todo é necessariamente anterior à parte; assim, se o corpo é destruído, não haverá mais nem pé nem mão, a não ser por simples analogia, como quando se fala de uma mão de pedra, pois uma mão separada do corpo não será melhor que essa. Todas as coisas definem-se sempre pelas suas funções e potencialidades; por conseguinte, quando elas não têm mais suas características próprias, não se deve dizer mais que se trata das mesmas coisas, mas apenas que elas têm o mesmo nome. É evidente, nessas condições, que a cidade existe naturalmente e que é anterior aos indivíduos, pois cada um destes, isoladamente, não é capaz de bastar-se a si mesmo e está, em relação à cidade, na mesma situação que uma parte em relação ao todo; o homem que é incapaz de viver em comunidade, ou que disso não tem necessidade porque basta-se a si próprio, não faz parte de uma cidade e deve ser, portanto, um bruto ou um deus.”

Por que o homem é naturalmente um ser político segundo a argumentação de Aristóteles?


Prof. Manoelito

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