terça-feira, 17 de setembro de 2013

“Três concepções de liberdade – Libertarismo, determinismo e Dialética”


O DETERMINISMO

Neste texto, vamos continuar aprofundando a discussão sobre liberdade, abordando um tema de grande relevância para a Filosofia, que é o determinismo.
Segundo a concepção determinista, o mundo, os acontecimentos e até o comportamento humano são regidos por leis necessárias e imutáveis, que escapam ao controle dos homens, de modo que a liberdade é impossível.
1. As coisas acontecem porque têm que acontecer ou somos nós que fazemos com que aconteçam? Justifique.
2. No dia a dia, fazemos inúmeras escolhas a todo momento: da roupa, do calçado ou do corte de cabelo que usamos; do livro que pegamos para ler; da notícia de jornal que privilegiamos; dos valores, das crenças e das opiniões que adotamos; das músicas que preferimos sintonizar no rádio ou baixar da internet; dos programas de TV a que assistimos; da profissão que almejamos no futuro; da pessoa com quem desejamos namorar ou casar etc. Enumere mais algumas escolhas do seu cotidiano e, em seguida, responda:
É você mesmo quem escolhe com liberdade ou você é induzido a preferir determinadas coisas e produtos em detrimento de outras?
Leia o texto com muita atenção e proponha uma solução para o dilema entre libertarismo e determinismo nas linhas que se seguem ao texto. Afinal, tanto um quanto outro apresentam aspectos positivos, mas também sérios problemas. Como então solucionar o impasse? Haveria uma posição conciliatória?
Determinismo e liberdade
Se procurarmos no dicionário, veremos que determinismo é a concepção segundo a qual “tudo no universo, até mesmo a vontade humana, está submetido a leis necessárias e imutáveis, de tal forma que o comportamento humano está totalmente predeterminado pela natureza, e o sentimento de liberdade não passa de uma ilusão subjetiva”. Portanto, se o comportamento humano é determinado, a liberdade torna-se impossível.
Se tudo é determinado, a rigor não há ato voluntário nem escolha. Como tudo é movido por uma causa que se encontra fora de nós, não podemos evitar agir como agimos. Daí também não podermos ser moralmente responsabilizados pelo que fazemos, visto que não poderíamos tê-lo feito de outro modo.
Este parece ser o caso, por exemplo, do cangaceiro Severino, personagem do filme O auto da compadecida. A certa altura da história, os protagonistas morrem, indo se encontrar no Juízo Final. Entre todos, porém, apenas Severino é absolvido de imediato e enviado para o Céu. A justificativa é a de que, pela vida miserável que levara, vítima de extrema violência e pobreza, não poderia ser culpabilizado pelos crimes e pecados que cometera. Seu destino fora estabelecido pelas condições em que viveu, sem que tivesse qualquer possibilidade de escolha.
O determinismo não significa que exista uma força coercitiva que nos obriga a agir de certa maneira. Na realidade, são as circunstâncias em que nos encontramos que produzem este agir. Assim, não sou eu quem escolhe (não há escolha livre), mas as circunstâncias escolhem por mim, compelindo-me a agir.
Como vemos, o determinismo cai no extremo oposto em relação ao libertarismo. Enquanto para este as circunstâncias externas são totalmente desconsideradas, em nome da preservação da liberdade, no determinismo elas são as únicas que contam, sacrificando-se a dimensão subjetiva e individual das escolhas humanas e, em última instância, a própria liberdade.
Ora, abdicar da liberdade é justamente o problema do determinismo. De fato, as circunstâncias externas determinam, em alguma medida, o comportamento humano, mas isso não significa que o homem seja mera vítima dessas circunstâncias.
Não se trata de negar a determinação do homem pelas circunstâncias externas, regressando ao libertarismo, mas de reconhecer essa determinação sem, contudo, considerá-la incompatível com a liberdade.
Aqui, porém, já estamos falando de outra posição sobre o problema da liberdade: a posição dialética, que será objeto de estudo mais adiante.
Pesquise na biblioteca, na internet ou em outras fontes, o que foi a Tragédia Grega e que papel ela cumpria na sociedade ateniense da época clássica.
Desafio!
1. O que é que vive na Terra e pela manhã possui quatro pés, dois ao meio-dia, e três à tarde? Justifique sua resposta.
2. Você acredita que existe um destino previamente traçado para cada pessoa e que não pode ser mudado? Justifique.

Leitura e Análise de Texto
No Brasil, há alguns anos, havia um programa de TV de perguntas e respostas, no qual o participante que acertasse todas as respostas ganharia 1 milhão de reais. Certa vez, um senhor aposentado chegou até a pergunta final, que era a seguinte: “Quantas letras há no lema da bandeira brasileira?” Se desistisse de responder, ganharia R$ 500 mil. Se errasse, sairia quase sem nada. O senhor decidiu encarar o desafio, mas errou a resposta.
Em vez de 15, contou 16 letras. Pensou em “Ordem ou progresso” em vez de “Ordem e progresso”. Saiu do programa com apenas 300 reais, valor que todos os participantes recebiam. Indagado sobre como se sentia após o ocorrido, afirmou que não estava “triste nem desapontado”. E completou: “As folhas não caem de uma árvore se Deus não quiser.
Ele julgou que não deveríamos vencer. Eu aceito. Talvez o dinheiro nos trouxesse problemas. Além do que, não perdi nada. Só deixei de ganhar”.
1. Você aceita como válida a explicação dada pelo senhor para o fato de não ter acertado a resposta? Justifique.
2. Você conhece situações em que as pessoas respondem, de forma semelhante à descrita no texto apresentado? Relate-as sumariamente e as comente, posicionando-se.

Leitura e Análise de Texto
“Sobre o destino”
Uma das formas mais comuns de manifestação do determinismo é o fatalismo, que consiste na concepção segundo a qual as coisas acontecem porque têm de acontecer, porque foram fixadas pelo destino, sem que se possa mudar o rumo dos acontecimentos.
Mas será que existe mesmo um destino previamente traçado e do qual não podemos escapar? Essa pergunta, que ainda intriga muita gente nos dias atuais, já era feita pelos gregos na Antiguidade. E, a julgar pela sina de Édipo, descrita na tragédia de Sófocles, a resposta, para eles, era afirmativa. Vejamos, então, um breve resumo dessa história.
Laio era rei de Tebas e Jocasta, a rainha. Não conseguiam ter filhos, por isso o rei decidiu ir a Delfos consultar o oráculo e receber orientações para ter um sucessor ao seu trono. A resposta do Oráculo transtorna Laio: se tiver um filho, este matará o pai e se casará com a mãe. Mortificado, Laio decide não ter filhos. Porém, em um momento de embriaguez ama Jocasta e a engravida. Os reis tornam-se pais de um menino, confiado a um pastor, que deveria levá-lo para uma montanha e matá-lo, para evitar a realização da profecia.
Ao chegar à montanha, porém, o pastor se comove com o olhar do menino e decide entregá-lo a outro pastor que, por sua vez, entregou-o ao rei Pólibo e à rainha Peribeia, de Corinto, que não tinham filhos e desejavam um. Adotam o filho de Laio e Jocasta com o nome de Édipo. Embora ele próprio desconhecesse sua origem, as pessoas do lugar sabiam que não era filho biológico do rei. Édipo ouvia comentários sobre não ser filho de Pólibo e, intrigado e insatisfeito, vai a Delfos consultar o oráculo para saber sua origem. O oráculo responde-lhe com a profecia que fizera a Laio: ele matará seu pai e se casará com sua mãe. Horrorizado, Édipo decide se exilar para o mais longe possível a fim de proteger aqueles a quem tinha como pais. Assim, em vez de voltar para Corinto, dirige-se a Tebas, sem saber que estava regressando à sua terra natal.
Tebas vivia uma epidemia de peste terrível. Preocupado, o rei Laio (pai biológico de Édipo) decide ir a Delfos pedir conselhos ao oráculo. No caminho, depara-se com Édipo (sem saber que se tratava de seu filho), justamente numa parte estreita da estrada em que só era possível passar uma carruagem de cada vez. Laio, na condição de soberano, julga ter prioridade na passagem e ordena a seu cocheiro que mande Édipo se afastar. O cocheiro obedece, demonstrando certa violência. Édipo reage e, na luta, mata o cocheiro e também Laio. Um dos membros do séquito real, porém, consegue fugir e retorna para Tebas.
Édipo, considerando que agiu em legítima defesa, segue seu caminho. Tempos depois, ao chegar à cidade, descobre que ela está sob a ameaça da Esfinge: um monstro com cabeça e seios de mulher e patas de leoa que se alojara às portas da cidade e se divertia propondo enigmas aos jovens tebanos. Quando não conseguiam responder, devorava-os. Creonte, irmão da rainha Jocasta, governava Tebas após a morte do rei. Ao se deparar com Édipo, alimenta a esperança de que talvez este jovem fosse capaz de resolver um enigma apresentado pela Esfinge, libertando a cidade dos males que estava sofrendo.
Propõe-lhe, então, que, se derrotar o monstro, poderá se casar com a rainha Jocasta. Édipo aceita o desafio. A Esfinge pergunta: “Quem, entre os que vivem na Terra, de manhã tem quatro pés, dois pés ao meio-dia e três à tarde?” Édipo responde que é o homem.
Quando criança ele engatinha, na idade adulta é bípede e na velhice usa uma bengala. A Esfinge, derrotada, atira-se do alto do rochedo e morre.
Édipo é recebido na cidade como herói e, como recompensa, casa-se com Jocasta, ignorando tratar-se de sua mãe e tornando-se rei de Tebas. Durante anos tudo corre muito bem e o casal tem quatro filhos. Até que, de repente, uma outra peste se abate sobre a cidade. As crianças nascem deformadas ou mortas. Uma doença misteriosa ataca homens, mulheres, crianças e idosos.
Creonte resolve mandar alguém a Delfos para saber do oráculo a origem dessa epidemia. A resposta é que a peste duraria enquanto o assassinato de Laio não fosse vingado.
Édipo, então, sem saber que o assassino era ele próprio, assume o compromisso de achar o culpado e inicia uma investigação. Nesse meio tempo, chega a Tebas um mensageiro, vindo de Corinto, trazendo uma triste notícia para o rei: a de que seus pais, o rei e a rainha de Corinto, haviam morrido. Triste e com sentimento de culpa por estar longe dos pais, Édipo justifica-se dizendo que saíra de Corinto por causa da previsão do oráculo de que mataria seu pai e se casaria com sua mãe. Ao ouvir isso, o mensageiro lhe revela que isso não seria possível, pois Pólibo e Peribeia não eram seus pais biológicos. Édipo, estarrecido, pergunta ao mensageiro como ele poderia saber de tudo aquilo. Ao que ele responde: “Eu sei porque fui eu quem entregou você a meus patrões”. “E quem te deu esta criança?”, pergunta Édipo. O mensageiro aponta para um dos presentes, reconhecendo o pastor de Laio que lhe havia entregue o menino. Édipo, então, se dirige ao pastor perguntando quem lhe dera a criança. Ele responde: “Jocasta”.
Édipo percebe que a profecia do oráculo se cumprira: ele era filho da mulher com quem se deitara e cujo marido, seu pai, fora morto por suas mãos. Feito um louco, corre para o palácio à procura de Jocasta e a encontra morta, enforcada com seu cinto. Inconformado e apavorado, fura os próprios olhos com as presilhas do vestido de sua mãe/esposa.
Resumo do mito narrado por Sófocles (dramaturgo grego que viveu entre 496 a.C. e 406 a. C.): Édipo Rei. Disponível em: <http://
www.dominiopublico.gov.br/pesquisa/DetalheObraForm.do?select_action=&co_obra=2255>. Acesso em: 12 jan. 2010.
1. Qual era a mensagem desta tragédia para a sociedade ateniense daquela época em relação à questão do destino? Justifique sua resposta.
2. Na história de Édipo ocorre uma sucessão de “acasos” que o conduzem à realização da profecia do oráculo: a bebedeira do pai, a fertilidade da mãe justamente naquele dia, a presença do outro pastor, o desejo dos reis de Corinto de ter um filho, o encontro com Laio na parte estreita da estrada, a fuga de um dos acompanhantes do rei, a Esfinge, a resposta ao enigma, a peste em Tebas, a chegada do mensageiro de Corinto etc. Esse determinismo presente nas narrativas trágicas mostra um encadeamento de eventos que condicionam um determinado fim, mas o determinismo está presente também nas explicações científicas, o chamado determinismo científico.
Converse com seus professores e colegas, consulte a internet e os livros disponíveis na biblioteca e indique exemplos de determinismo nas ciências.


Sugestão de Filme
• Quem quer ser um milionário (Slumdog Millionaire), Direção: Danny Boyle. Inglaterra, 2008. 120 min. 16 anos. Drama. O filme vencedor do Oscar de 2009, apresenta um jovem indiano, chamado Jamal, morador de uma favela e que trabalha servindo chá em um call center, que decide participar de um programa de TV homônimo ao filme.
Para a estupefação de todo o país, o jovem consegue chegar à última pergunta, ficando prestes a ganhar o prêmio máximo: 20 milhões de rúpias.
Após assistir ao filme, reflita: Você vê semelhanças entre as histórias do protagonista Jamal, do senhor que participou do programa brasileiro de perguntas e respostas e de Édipo? Quais?



Leitura e Análise de Texto
Música: Partido alto

Diz que deu, diz que dá
Diz que Deus dará
Não vou duvidar, ô nega
e se Deus não dá
Como é que vai ficar, ô nega
Diz que Deus diz que dá
E se Deus negar, ô nega
Eu vou me indignar e chega
Deus dará, Deus dará
Deus é um cara gozador, adora brincadeira
Pois pra me jogar no mundo, tinha o mundo
[inteiro
Mas achou muito engraçado me botar
[cabreiro
Na barriga da miséria, eu nasci batuqueiro
Eu sou do Rio de Janeiro
Jesus Cristo inda me paga, um dia inda
[me explica
Como é que pôs no mundo esta pobre

[coisica
Vou correr o mundo afora, dar uma
[canjica
Que é pra ver se alguém se embala ao
[ronco da cuíca
E aquele abraço pra quem fica
Deus me fez um cara fraco, desdentado
[e feio
Pele e osso simplesmente, quase sem
[recheio
Mas se alguém me desafia e bota a mãe
[no meio
Dou pernada a três por quatro e nem me
[despenteio
Que eu já tô de saco cheio
Deus me deu mão de veludo pra fazer
[carícia
Deus me deu muitas saudades e muita
[preguiça
Deus me deu pernas compridas e muita
[malícia
Pra correr atrás de bola e fugir da polícia
Um dia ainda sou notícia.
Chico Buarque
1972 © Marola Edições Musicais ltda.



Com base na letra da música, responda às questões:

1. Você vê alguma relação entre a música e o conteúdo do texto apresentado? Fundamente sua
resposta.
2. A seu ver, as situações descritas na música podem ser atribuídas a Deus? Justifique.
Leitura e Análise de Texto
Liberdade humana e providência divina
Outra forma de manifestação do determinismo é a doutrina da providência divina. Providência vem do latim providentia e significa conhecer, ver ou descobrir antecipadamente.
Nesse sentido, essa doutrina se assemelha bastante ao fatalismo, com a diferença de que ela possui um caráter mais explicitamente religioso. Em linhas gerais, consiste em afirmar que Deus é o criador da ordem do mundo e responsável pela condução dos acontecimentos.
Em outras palavras, o mundo possui uma ordem racional que vem de Deus e que compreende tanto os acontecimentos quanto as ações dos homens. De modo geral, a doutrina da providência implica negar a possibilidade da liberdade humana, pois ao homem cabe apenas adequar-se aos desígnios divinos.
O tema da providência foi objeto da preocupação de vários filósofos ao longo da história. Alguns deles, porém, procuraram conciliar a tese da ordenação divina com a liberdade do homem. Um desses foi o inglês Thomas Hobbes, que viveu entre os séculos XVI e XVII.
Em sua obra Leviatã, na qual expõe suas teses políticas, dedica o capítulo XXI à questão da liberdade dos súditos. Inicia definindo a liberdade: “liberdade significa, em sentido próprio, a ausência de oposição (entendendo por oposição os impedimentos externos do movimento)”. 1
Em seguida, apresenta alguns exemplos de situações em que não há liberdade: quando alguém está “amarrado ou envolvido de modo a não poder mover-se”; as “criaturas vivas, quando se encontram presas ou limitadas por paredes ou cadeias”; “as águas, quando são contidas por diques ou canais”.2
No caso do conceito de “livre-arbítrio”, Hobbes atribui a ele um significado um pouco diferente. Assim como quando dizemos “o caminho está livre” não pretendemos afirmar a liberdade do caminho propriamente dito, mas sim das pessoas que por ele passam, assim também, quando falamos em livre-arbítrio não podemos inferir dessa expressão a “liberdade da vontade, do desejo ou da inclinação, mas apenas a liberdade do homem”.3 Esta “consiste no fato de ele não deparar com entraves ao fazer aquilo que tem vontade, desejo ou inclinação”.4 Em outras palavras, o homem é livre para fazer o que tem vontade, mas não é livre para escolher a vontade, o desejo e a inclinação que tem. A vontade, o desejo e a inclinação que há no homem derivam de outras causas, alheias a ele. Mais precisamente, derivam de uma cadeia de causas, cuja origem está em Deus, que é a causa primeira de tudo.
Assim, Hobbes procura conciliar liberdade e necessidade: “A liberdade e a necessidade são compatíveis: tal como as águas não tinham apenas a liberdade, mas também a necessidade de descer pelo canal, assim também as ações que os homens voluntariamente praticam, dado que derivam de sua vontade, derivam da liberdade; ao mesmo tempo que, dado que os atos da vontade de todo homem, assim como todo desejo e inclinação, derivam de alguma causa, e esta de uma outra causa, numa cadeia contínua (cujo primeiro elo está na mão de Deus, a primeira de todas as causas), elas derivam também da necessidade. De modo tal que para quem pudesse ver na conexão dessas causas a necessidade de todas as ações voluntárias dos homens pareceria manifesta”.5
Se, em última instância, a origem da vontade humana encontra-se em Deus, então a ideia de providência divina fica preservada: “Portanto Deus, que vê e dispõe todas as coisas, vê também que a liberdade que o homem tem de fazer o que quer é acompanhada pela necessidade de fazer aquilo que Deus quer, e nem mais nem menos do que isso. Porque, embora os homens possam fazer muitas coisas que Deus não ordenou, e das quais portanto não é autor, não lhes é possível ter paixão ou apetite por nada de cujo apetite a vontade de Deus não seja a causa”.6
Não fosse assim, a liberdade do homem “seria uma contradição e um impedimento à onipotência e liberdade de Deus”.7
É, pois, por esse raciocínio que Hobbes procura conciliar a liberdade do homem com a providência divina. Trata-se, porém, de uma liberdade limitada pelo fato de ser a vontade humana, necessariamente, derivada da vontade de Deus.
Ora, entre os atributos de Deus estão a sapiência, a bondade, o amor, a justiça. Assim, atribuir a ele a causa da vontade humana como da ordem do mundo e dos acontecimentos não seria uma forma de minimizar a responsabilidade do homem pelas circunstâncias em que vive? Não seria uma estratégia eficaz para sacralizar e legitimar o mundo e a ordem social vigente? Nesse sentido, não haveria na tese da providência divina, pelo menos na forma acrítica em que ela comumente é apresentada, um sentido politicamente conservador?
1 HOBBES, Thomas. Leviatã ou Matéria, forma e poder de um Estado eclesiástico e civil. Tradução João P. Monteiro e Maria B. N. da Silva. São Paulo: Nova Cultural, 1983. p. 129. (Os Pensadores).
Após a leitura dos textos, responda as seguintes questões:
1. Em que consiste a tese da providência divina?
2. O que pensa Hobbes sobre a liberdade?
3. O que é determinismo?
4. Como Hobbes procura eliminar a contradição entre providência divina e livre-arbítrio? Você concorda? Justifique.
5. Em folha avulsa, elabore uma breve dissertação comparando libertarismo e determinismo, com base nos autores estudados.


A CONCEPÇÃO DIALÉTICA DA LIBERDADE
Neste texto será abordada uma concepção de liberdade que busca superar a contradição entre o libertarismo e o determinismo. Para tanto, iniciaremos com a análise da letra da música Como uma onda (Zen Surfismo), de Nelson Motta e Lulu Santos, e com a leitura do texto A dialética.
Leitura e Análise de Texto
Música: Como uma onda (Zen Surfismo) Composição: Nelson Motta/lulu Santos.
Como uma onda

Nada do que foi será
De novo do jeito que já foi
um dia
Tudo passa, tudo sempre
passará
A vida vem em ondas,
como um mar
Num indo e vindo
infinito
Tudo que se vê não é
Igual ao que a gente viu há
um segundo
tudo muda o tempo todo no
mundo
Não adianta fugir
Nem mentir pra si mesmo
agora
Há tanta vida lá fora
Aqui dentro sempre
Como uma onda no mar
Como uma onda no mar
Como uma onda no mar


A dialética
Vimos que tanto o libertarismo como o determinismo levantam aspectos importantes sobre o problema da liberdade, mas não oferecem respostas suficientes para ele. Enquanto o primeiro desconsidera a influência das circunstâncias em nossas decisões, o segundo enfatiza de tal maneira essa influência que chega a negar a liberdade. Mas haverá uma posição capaz de incorporar a contribuição positiva dessas duas concepções da liberdade e, ao mesmo tempo, superar suas limitações? Uma posição que admita os condicionamentos externos sem abrir mão da liberdade? Uma possível resposta parece estar na concepção dialética da liberdade.
Mas o que vem a ser dialética? De acordo com o Dicionário Houaiss, “em sentido bastante genérico”, a palavra está associada à ideia de “oposição, conflito originado pela contradição entre princípios teóricos ou fenômenos empíricos”.1
Um dos primeiros a desenvolver essa forma de pensar foi Heráclito (séculos VI e V a.C.), filósofo grego do período pré-socrático que viveu na cidade de Éfeso. Para ele, nada é imóvel, imutável, isto é, nada permanece aquilo que é; ao contrário, tudo está em movimento, tudo muda, tudo flui, tudo se transforma, tudo é devir. Por isso, ele teria dito:
“Não se pode entrar duas vezes no mesmo rio”, porque tanto as águas como a pessoa que nelas entra novamente já não são as mesmas.
O motor dessa transformação é a contradição que está contida em todas as coisas. Isso quer dizer que, no interior de cada coisa, há forças opostas em luta entre si e que fazem com que ela deixe de ser o que é e se torne outra coisa. Em outras palavras, cada coisa é uma “unidade de contrários”. Dia e noite, vida e morte, luz e escuridão, tristeza e alegria, quente e frio, amor e ódio, acaso e necessidade, beleza e feiura, enfim, qualquer que seja a dupla de contrários que se imagine, cada elemento da contradição traz dentro de si a sua negação (o seu contrário) e nele se transforma, num movimento infinito.
No tempo de Sócrates e Platão, a palavra “dialética” designava certo modo de discutir ou dialogar que tinha por objetivo explicitar as contradições presentes no raciocínio dos interlocutores, a fim de superar as divergências das opiniões particulares e atingir o conhecimento verdadeiro.2 Portanto, também aí o conceito de dialética estava associado à ideia de contradição, de conflito, de antagonismo e de busca de sua superação. No caso da dialética socrática e platônica, tratava-se da contradição presente no pensamento e no discurso, responsável por produzir um conhecimento falso ou, pelo menos, impreciso (opinião – doxa) e que precisava ser substituído por outro, considerado verdadeiro (ciência – episteme).
De lá para cá, ao longo da história da Filosofia, inúmeros filósofos fizeram uso do conceito de dialética, atribuindo a ele diferentes conotações, mas sempre enfatizando o aspecto da contradição. Esta, portanto, constitui um elemento fundamental na perspectiva dialética.
Mas quem de fato sistematizou a dialética como método de interpretação da realidade foi um filósofo alemão idealista, dos séculos XVIII e XIX, chamado Georg Wilhelm Friedrich Hegel. De modo muito simplificado, podemos dizer que Hegel, retomando a tese de Heráclito da luta dos contrários, concebe a História como um processo que resulta das contradições presentes no pensamento. Analisando a evolução do pensamento humano, Hegel percebeu que ela ocorre por um processo que envolve três momentos: o da tese (afirmação de uma ideia ou posição), o da antítese (afirmação da ideia contrária à primeira) e o da síntese (conclusão derivada da superação da contradição entre as duas primeiras). Esta conclusão, uma vez estabelecida, se transformará numa nova síntese, recomeçando-se o processo. É o que ocorre, por exemplo, segundo ele, com os sistemas filosóficos que ao longo da história sucederam-se uns aos outros por um processo de tese, antítese e síntese. Como, porém, Hegel considerava o pensamento (as ideias, a consciência, o espírito) o motor da História, sua filosofia tem caráter idealista.
Marx absorve o núcleo dialético do pensamento hegeliano, mas confere a ele um caráter materialista. Para ele, a realidade, o mundo, a sociedade também estão permeados por contradições, mas estas não derivam do pensamento, e sim do modo como os homens produzem a sua existência material e do tipo de relações sociais que estabelecem entre si nesse processo produtivo. Por exemplo, no modo de produção capitalista, as relações sociais dominantes ocorrem entre capitalistas (proprietários dos meios de produção) e proletários (proprietários da força de trabalho). Entre estas duas classes sociais, há uma relação de contradição, de antagonismo, pois a realização dos interesses de uma (exploração do trabalho e obtenção da mais-valia) implica a negação dos interesses da outra (libertação da exploração). Assim, uma das principais contradições da sociedade é justamente a luta de classes, que, na visão de Marx e Engels, não é exclusiva da sociedade capitalista, mas algo que se verifica em toda a história da humanidade e que, para eles, atua como motor das transformações que se sucederam ao longo desta história. Nas palavras dos autores:
“A história de todas as sociedades que existiram até nossos dias tem sido a história das lutas de classes. Homem livre e escravo, patrício e plebeu, barão e servo, mestre de corporação e companheiro, numa palavra, opressores e oprimidos, em constante oposição, têm vivido numa guerra ininterrupta, ora franca, ora disfarçada; uma guerra que terminou sempre ou por uma transformação revolucionária, da sociedade inteira, ou pela destruição das duas classes em luta.
Nas primeiras épocas históricas, verificamos, quase por toda parte, uma completa divisão da sociedade em classes distintas, uma escala graduada de condições sociais. Na Roma Antiga encontramos patrícios, cavaleiros, plebeus, escravos; na Idade Média, senhores, vassalos, mestres, companheiros, servos; e, em cada uma destas classes, gradações especiais.
A sociedade burguesa moderna, que brotou das ruínas da sociedade feudal, não aboliu os antagonismos de classe. Não fez senão substituir novas classes, novas condições de opressão, novas formas de luta às que existiram no passado”.3
Assim, para Marx e Engels, não é o pensamento que, organizando-se de forma contraditória (tese, antítese e síntese), produz a realidade material, mas, sim, a realidade que, por força das contradições nela inerentes (como a luta de classes, por exemplo), gera as diferentes formas de pensamento. Dizendo de outra maneira: “Não é a consciência que determina a vida, mas, sim, a vida que determina a consciência”.4
Eis, portanto, o materialismo de Marx e Engels. Mas, como se trata de um materialismo dialético, isto é, que afirma a existência da contradição, da luta dos contrários, essa relação de determinação também é contraditória, de modo que, se, de um lado, a consciência é determinada pela vida, de outro lado, esta também é determinada por aquela. Há, na realidade, uma “ação recíproca” de mútua determinação entre os elementos opostos. Daí a conclusão dos autores para todo esse raciocínio de que “é tão verdade serem as circunstâncias a fazerem os homens como a afirmação contrária”.5
Esta última afirmação já nos sugere um caminho alternativo para superar a contradição entre determinismo e libertarismo.

Questões:
1. Que relação a música Como uma onda (Zen Surfismo) pode ter com a noção de dialética? Justifique.
2. Como se pode definir a dialética em um sentido mais geral?
3. Qual é o significado da frase atribuída a Heráclito: “Não se pode entrar duas vezes no mesmo rio”? Você concorda com ele?
4. Que sentido tinha o termo “dialética” para Sócrates e Platão?
5. Qual é a principal diferença entre a dialética de Hegel e a de Marx e Engels?
6. Analise e comente o significado da frase de Marx e Engels: “A história de todas as sociedades que existiram até nossos dias tem sido a história das lutas de classes”.

Dialética e liberdade
O problema da liberdade diz respeito à concepção que se tem do homem e de seu papel (ativo ou passivo) na história. Ora, na perspectiva do materialismo histórico dialético, o homem não pode ser concebido como um ser abstrato, isolado, destacado do mundo concreto em que vive (como faz, por exemplo, o libertarismo). Ele é, “em sua realidade, o conjunto das relações sociais”1, diz Marx. Afirmar que o homem é “o conjunto das relações sociais” é reconhecer que ele não é um indivíduo isolado, abstrato, pura subjetividade, imune às circunstâncias em que vive e às relações sociais que estabelece com seus semelhantes.
Pelo contrário, ele é, em grande medida, produto dessas relações e transforma-se continuamente com as transformações dessas relações. O homem da sociedade capitalista não é o mesmo do feudalismo, que, por sua vez, não é o mesmo do escravismo, que não é o mesmo das comunidades primitivas. Podemos dizer, portanto, que o homem é determinado pelas relações sociais ou que ele é socialmente determinado.
Mas, como vimos, a dialética supõe a contradição e a ação recíproca entre os elementos de uma dupla de contrários. Portanto, conceber o homem dialeticamente implica entender que a relação dele com a História, com a sociedade, com a natureza, com os outros homens, enfim, com a realidade que o cerca é também contraditória e de mútua determinação.
Assim, se as relações sociais produzem os homens, assim também os homens produzem as relações sociais que vivenciam. Ou, mais fielmente às palavras de Marx e Engels: “É tão verdade serem as circunstâncias a fazerem os homens como a afirmação contrária”.2
Assim, do ponto de vista da dialética, o homem tem um papel ativo na determinação das circunstâncias em que vive. Mas, como ele é também socialmente determinado, cabe perguntar: Em que medida ele é realmente capaz de alterar as relações sociais de que participa? Até onde vai o seu poder de fazer a História? Com que grau de liberdade ele o exerce? De acordo com Marx: “Os homens fazem sua própria história, mas não a fazem como querem; não a fazem sob circunstâncias de sua escolha e, sim, sob aquelas com que se defrontam diretamente, legadas e transmitidas pelo passado”.3 Não se trata, portanto, de um poder ilimitado, absoluto, tampouco de um poder irrisório, insignificante, nulo.
Concluindo, podemos dizer que a perspectiva dialética permite superar tanto a onipotência do libertarismo quanto a impotência do determinismo, colocando sobre nossos ombros a exata medida de responsabilidade que nos cabe na construção de nosso destino.
De fato, não podemos tudo. Mas há algo que podemos, a partir das condições objetivas em que nos encontramos. E é nesta margem relativa de possibilidades limitadas que podemos fazer valer a nossa liberdade.

Questões:
1. O que significa dizer que o homem é um “conjunto de relações sociais”?
2. Como a concepção dialética procura superar a contradição entre libertarismo e determinismo? Posicione-se.
3. De que forma o conceito de ação recíproca pode questionar o determinismo?
4. Apresente a diferença entre a concepção de dialética dos diferentes autores analisados.
5. Elabore, em folha avulsa, uma dissertação sobre o tema “a concepção dialética de liberdade” como forma de superação do libertarismo e do determinismo.

LIÇÃO DE CASA
Analisem, em folha avulsa, as letras das músicas, procurando explicitar e discutir a concepção de liberdade nelas subjacente. As músicas são “O sal da Terra”, de Beto Guedes e Ronaldo Bastos, e “O amanhã, de João Sérgio”, apresentada a seguir.

Música: O sal da Terra
Composição: Beto Guedes/Ronaldo Bastos
Leitura e Análise de Texto

O Sal da Terra
Beto Guedes
Anda!
Quero te dizer nenhum segredo
Falo nesse chão, da nossa casa
Vem que tá na hora de arrumar...
Tempo!
Quero viver mais duzentos anos
Quero não ferir meu semelhante
Nem por isso quero me ferir

Vamos precisar de todo mundo
Prá banir do mundo a opressão
Para construir a vida nova
Vamos precisar de muito amor
A felicidade mora ao lado
E quem não é tolo pode ver...
A paz na Terra, amor
O pé na terra
A paz na Terra, amor
O sal da...
Terra!
És o mais bonito dos planetas
Tão te maltratando por dinheiro
Tu que és a nave nossa irmã
Canta!
Leva tua vida em harmonia
E nos alimenta com seus frutos
Tu que és do homem, a maçã...
Vamos precisar de todo mundo
Um mais um é sempre mais que dois
Prá melhor juntar as nossas forças
É só repartir melhor o pão
Recriar o paraíso agora
Para merecer quem vem depois...
Deixa nascer, o amor
Deixa fluir, o amor
Deixa crescer, o amor
Deixa viver, o amor
O sal da terra


“O amanhã, de João Sérgio”

O Amanhã
A cigana leu o meu destino
Eu sonhei!
Bola de cristal
Jogo de búzios, cartomante
E eu sempre perguntei
O que será o amanhã?
Como vai ser o meu destino?
Já desfolhei o malmequer
Primeiro amor de um menino...
E vai chegando o amanhecer
leio a mensagem zodiacal
E o realejo diz
Que eu serei feliz
Como será amanhã?
Responda quem puder
O que irá me acontecer?
O meu destino será
Como Deus quiser
João Sérgio
© Top Tape Edições Musicais.



Prof. Manoelito

2 comentários:

  1. o senhor poderia me ajudar nesta pesquisa ?
    ( o que foi a tragedia Grega e que papel ela cumpria na Sociedade ateniense da epoca classica)

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  2. eu preciso de ajuda na
    Qual era a mensagem dessa tragedia para a sociedade ateniense daquela época em relação ao destino

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