segunda-feira, 8 de agosto de 2016

O TRABALHO COMO MEDIAÇÃO


O objetivo deste tema é discutir o trabalho como mediação entre o ser humano e a natureza. “O trabalho na Antiguidade estava associado a esforço físico, cansaço e penalização. A origem da palavra, no latim vulgar, associa trabalho/tripalium a um instrumento de tortura feito de três varas cruzadas ao qual os réus eram presos. O trabalho representava uma atividade indigna, reservada aos escravos. Aos que viviam livremente, a subsistência vinha da coleta de frutos, da caça e outras atividades; o tempo do trabalho era o da natureza – dia ou noite, com sol ou chuva. [...] Na era moderna, o trabalho teve o seu significado transformado, passou de atividade desprezada à condição de expressão da própria humanidade, fonte de produtividade e riqueza. Com as mudanças sociais, econômicas, políticas e culturais, no século XX, a ideia do trabalho firmou-se como uma atividade valorizada”.
O que é trabalho? Na civilização ocidental, a percepção de que o trabalho é algo que traz sofrimento é reforçada por outras ideias influenciadas pelas tradições greco-romana e judaico-cristã.  Para os gregos, de uma forma geral, o trabalho era visto como algo que “embrutecia os espíritos” e tornava o ser humano incapaz da prática da virtude; era um mal que a elite deveria evitar. Por isso, era executado por escravos, ficando a cargo dos cidadãos as atividades mais nobres, como a política. No cristianismo, o episódio bíblico da expulsão de Adão e Eva do Paraíso, como consequência do pecado original, condenando-os ao trabalho, a ganhar o “pão com o suor do rosto”, ampliou a conotação negativa do trabalho. Assim, ele apresenta, em nossa sociedade, também os sentidos de fadiga, luta, dificuldade e punição.
Trabalho: conjunto de atividades, produtivas ou criativas, que o homem exerce para atingir determinado fim. Essa definição enfatiza que o trabalho é uma atividade humana, ou seja, só os seres humanos trabalham. Você conhece outros seres vivos que também empregam suas forças e faculdades para conseguir um objetivo? Alguns animais também trabalham: as aranhas tecem teias, as abelhas constroem as colmeias, as formigas constroem os formigueiros etc. Vocês conhecem a fábula “A cigarra e a formiga”. Existem várias versões dessa fábula, mas a sinopse pode ser uma só: a história da cigarra que só queria cantar e se divertir e da formiga que só trabalhava. Um dia, elas se encontram e a cigarra questiona o porquê de a formiga trabalhar. Esta responde que precisava trabalhar naquele momento para ter alimento no inverno. Como era verão, a cigarra riu da formiga e replicou que o inverno estava longe demais para que ela se preocupasse. Passados alguns meses, chegou o inverno e a cigarra quase morreu de frio e fome. Quando estava com pouca força, bateu à porta da formiga e pediu ajuda. Esta a ajudou, mas lembrou-lhe da importância de trabalhar e poupar.
Alguns animais são vistos, pelo senso comum, como animais trabalhadores. Mas, na perspectiva sociológica, os animais não trabalham, só o ser humano trabalha. O trabalho é visto como uma atividade que ajuda o ser humano a construir a sua condição humana. Para esclarecer a questão do trabalho como atividade do ser humano, recorreremos aos textos I e II de  Karl Marx.
Karl Marx nasceu na Alemanha, em 1818. Considerado um dos maiores filósofos alemães, realizou estudos importantes também para a Economia e a Sociologia. Tendo como base a dialética1, desenvolveu o  método que permite a explicação da história das sociedades humanas a partir das relações sociais de produção. Radical tanto na teoria como na militância, participou ativamente de diversas organizações operárias clandestinas, tendo sido expulso de alguns países. Exilado na Inglaterra, passou por muitas dificuldades financeiras, sendo socorrido por amigos, como Friedrich  Engels. Morreu em Londres, em 1883. 1 Dialética é o método de explicação da realidade que tem por base o princípio lógico da contradição, ou seja, a contraposição de ideias ou situações que leva a uma nova ideia ou situação.
TEXTO 1 O conceito é ambíguo e disputado, indicando diferentes atividades em diferentes sociedades e contextos históricos. Em seu sentido mais amplo, trabalho é o esforço humano dotado de um propósito e envolve a transformação da natureza através do dispêndio de capacidades mentais e físicas. Tal interpretação, contudo, conflita com o significado e a experiência mais limitados do trabalho nas atuais sociedades capitalistas. Para milhões de pessoas trabalho é sinônimo de emprego remunerado, e muitas atividades que se qualificariam como trabalho na definição mais ampla são descritas e vivenciadas como ocupações em horas de lazer, como algo que não significa verdadeiramente trabalho. OUTHWAITE, William; BOTTOMORE, Tom. Dicionário do pensamento social do século XX.  Rio de Janeiro: Zahar, 1996. p. 773.
TEXTO 2 Uma aranha executa operações que se assemelham às de um tecelão, e a abelha, na construção de suas colmeias, deixa envergonhado mais de um arquiteto. Mas o que distingue o pior arquiteto da melhor das abelhas é isso: o arquiteto projeta sua obra antes de construí-la na realidade. No final de todo processo de trabalho, temos um resultado que já existia na imaginação do trabalhador desde o seu começo. MARX, Karl. Capital – A Critique of Political Economy. The labour-process and the process of producing surplus-value.  Vol. 1, Part III, Section 1, cap. VII. Tradução Heloísa Helena Teixeira de Souza Martins. Disponível em: <http://www. marxists. org/archive/marx/works/1867-c1/index.htm>.  Acesso em: 3 dez. 2013.
O trabalho humano distingue-se do trabalho animal, pois o homem planeja antes de executar uma atividade. Ele concebe o trabalho antes de executá-lo. Já os outros animais não possuem essa capacidade. Eles “trabalham” de forma instintiva. Na verdade, é equivocado usar o termo trabalho para se referir às atividades realizadas pelos outros animais. Estes executam tarefas guiados pelo instinto. A abelha faz o mel e constrói a colmeia instintivamente. Por isso, todas as colmeias de uma mesma espécie de abelha seguem a mesma configuração. A formiga também constrói instintivamente os formigueiros, e, por isso, eles seguem a mesma estrutura. O mesmo processo ocorre com o joão-de-barro e sua casa.
Os animais só mudam sua maneira de agir quando ocorre alguma alteração no meio, o que os leva a se adaptar, mas eles não mudam suas atitudes intencionalmente. Só o ser humano tem essa capacidade, as outras espécies, não. Com o objetivo de conseguir os meios que garantam a sua sobrevivência, o ser humano age sobre a natureza, transformando-a. Ele se apropria dos materiais existentes na natureza e cria objetos, inventa coisas e se relaciona com outros seres humanos por meio do trabalho. Desse modo, o trabalho é uma atividade de mediação entre o ser humano e a natureza.
O ser humano emerge gradualmente, desenvolve-se e adquire a sua humanidade no exercício de sua atividade, de seu trabalho, da sua produção social. Nesse sentido, pode-se dizer que, ao trabalhar, o ser humano se constrói como ser humano, pois ele age de forma deliberada e consciente sobre a natureza. É por isso que o trabalho é visto como uma atividade que ajuda o ser humano a construir sua condição humana.
Como o conceito de trabalho é ambíguo, pode ter diferentes significados. Para muitas pessoas, trabalho é sinônimo de emprego, como se só trabalhasse quem tem emprego.
Distinção entre trabalho e emprego. O trabalho sempre existiu, sob diferentes formas, ao longo da história da humanidade, já que é toda a atividade humana que envolve a transformação da natureza para atingir um fim. Entretanto, emprego é uma relação social de trabalho muito recente, que surge a partir do momento em que o ser humano deixa de ser escravo ou servo e se transforma em um ser humano livre. Livre para vender o seu trabalho e estabelecer um contrato com um comprador, em troca de um salário que lhe permita adquirir os meios de vida necessários à sua sobrevivência. Emprego pressupõe trabalho assalariado – portanto, ele é algo característico da sociedade capitalista.
“O trabalho livre sucedeu historicamente a outras formas de trabalho, como a escravidão e a servidão. Na Grécia Antiga, o trabalho era uma atividade exercida pelos escravos. Na Idade Média, as pessoas trabalhavam nos campos, ligadas a um senhor feudal, ou moravam nos burgos e eram artesãos. Em todos esses momentos da história, as pessoas executavam algum trabalho, mas não tinham emprego. O emprego só se disseminou com o capitalismo, quando o trabalhador passou a vender a sua força de trabalho (física ou mental) em troca de um salário. Ao conseguir o emprego, o trabalhador assina um contrato de trabalho que especifica suas funções. Ao contrário do que ocorria na Antiguidade, em que os escravos eram uma propriedade, e na Idade Média, em que os trabalhadores eram servos presos à terra do senhor feudal, no capitalismo os trabalhadores são “livres” para procurar outras condições de trabalho em um novo emprego”.
A liberdade no capitalismo para muitos dos trabalhadores é relativa, uma vez que a maioria não pode escolher a quem, quando e, muitas vezes, onde procurar emprego. Mas o significado mais importante do trabalho livre ou da liberdade do trabalhador é dado pelo fato de que, com o esfacelamento do sistema feudal de produção, o servo libertou-se das amarras que o prendiam ao senhor feudal, mas perdeu o acesso aos meios de produção (terra, matéria-prima, instrumentos de trabalho). Então, passou a dispor de uma única propriedade: a sua força de trabalho.
Questões:
1.       Explique origem da palavra trabalho e a que estava associado.
2.       Como o trabalho era visto, para os gregos?
3.       Qual definição enfatiza que o trabalho é uma atividade humana, ou seja, só os seres humanos trabalham.
4.       Explique trabalho em seu sentido mais amplo, trabalho.
5.       O que distingue o pior arquiteto da melhor das abelhas, segundo Karl Marx?
6.       Por que, o trabalho humano distingue do trabalho animal?
7.       Por que o trabalho é uma atividade de mediação entre o ser humano e a natureza?
8.       Qual a diferença entre trabalho e emprego?                                                                   

Prof. Manoelito

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