terça-feira, 18 de março de 2014

CONTEÚDOS DAS SITUAÇÕES 3 e 4 - 2ª SÉRIE - 1º BIMESTRE - AVALIAÇÃO 2

SITUAÇÃO 3 A LIBERDADE - JEAN-PAUL SARTRE - (1905-1980)1. O existencialismo de Sartre (RAÍZES:fenomenologia de Husserl e em 'Ser e Tempo' de Heidegger ) O existencialismo sartriano procura explicar os aspectos da experiência humana. Sistematizada em dois livros: "O ser e o nada" e "Crítica da razão dialética”. 2. VIDA É ENTENDIDA COMO UM PROJETO QUE SE REALIZA PELAS ESCOLHAS 3. 4. O Em-si (fenomenologia e o existencialismo) O mundo é povoado de seres Em-si . São objetos existente no mundo e que possui uma essência definida . Uma caneta, por exemplo, é um objeto criado para suprir uma necessidade: a escrita. 5. 6. Um ser Em-si não tem potencialidades nem consciência de si ou do mundo. Ele apenas é . Os objetos do mundo apresentam-se à consciência humana através das suas manifestações físicas ( fenómenos ). 7. 8. O Para-si A consciência humana é um ser com forma diferente, possui conhecimento de si e do mundo. É o Para-si faz relações temporais e funcionais entre os seres Em-si e ao fazer isso constrói um sentido para o mundo em que vive. 9. 10. O Para-si não tem uma essência definida. Ele não é resultado de uma idéia pré-existente . Diferente dos seres em-si que possuem essencia definida 11. O existencialismo sartriano é ateu, não admite a existência de um criador que tenha predeterminado a essência e os fins de cada pessoa. 12. 13. Durante sua existência o Para-si define, a cada momento (escolha), o que é sua essência. 14. 15. A CONDIÇÃO HUMANA “ CADA UM É DETERMINADO PELO AMBIENTE E PELAS CIRCUNSTANCIAS” “ ... Mas tenho liberdade de mudar minha vida deste momento em diante”. 16. 17. Meu ser passado é um Em-si , possui uma essência conhecida, mas essa essência não foi predeterminada . “ Cada pessoa só tem como essência imutável, aquilo que já viveu”. 18. “A existência precede e governa a essência" . Por esta mesma razão cada Para-si tem a liberdade de fazer de si o que quiser. 19. A liberdade “ O ser humano está condenado à liberdade” . Toda pessoa a cada momento escolhe o que fará de sua vida, não há um destino previamente concebido. 20. As escolhas de cada um são direcionadas por projetos . Projeto é aquilo que você faz de sua vida e não aquilo que gostaria de fazer. 21. Há vários tipos de projeto, escrever um livro, comprar uma casa, “ Todas as pessoas são movidas por um projeto fundamental, o projeto de auto-realização, da transcendência ”. 22. Sonhamos em ser pessoas que realizaram todas as suas potencialidades, todos os projetos. Um ser que realizou tudo o que podia esgota suas potencialidades, tornar-se um Em-si. Isso irá acontecer quando morremos. 23. Quando a consciência deixa de existir, tornamos completo e acabado. Mas a morte é uma contingência, não podemos evitar e impede a concretização de nossos projetos. Não é a morte a transcendência desejada. 24. Sartre diz que o projeto fundamental é tornar-se um ser que já realizou tudo, mas preservando sua consciência, um ser Em-si-Para-si . Tal ser corresponde à noção que temos de Deus, um ser completo, sem limitações e com todas as suas potencialidades já realizadas, mas ainda consciente de si e do mundo. “ O homem é um ser que projeta tornar-se Deus". 25. A liberdade é escolher o caminho mais curto em direção ao projeto fundamental. Sempre sujeitos a limitações e contingências . Ex.: Não posso voar, mas posso agir, apesar destas limitações. Isso não diminui a liberdade. “ São as limitações que tornam a liberdade possível” , se realizássemos o que quiséssemos, tornaríamos um em sí. 26. A responsabilidade Cada escolha carrega consigo uma responsabilidade . Se escolho ir a algum lugar, falar alguma coisa, escrever um artigo, tenho que ter consciência de que qualquer conseqüência desses atos terá sido resultado de minha própria escolha. 27. “ E cada escolha ao ser posta em ação provoca mudanças no mundo que não podem ser desfeitas”. Não posso,atribuir a responsabilidade por estes atos a nenhuma força externa, ao destino ou a Deus . 28. “ Cada escolha que faço, torno-me responsável não só por mim, mas por toda a humanidade”. “ E faço isso por minha própria escolha, para que o mundo se torne mais como eu o projetei”. Eis a essência da responsabilidade: “ Eu, por minha vontade e escolha, ajo no mundo e afeto o mundo todo. Ser livre é ser responsável”. 29. As limitações me impõem escolhas. Um preso tem a liberdade e escolhas a fazer. Esta é, para Sartre, a verdadeira liberdade que ninguem pode escapar: "não é a liberdade de realização, mas a liberdade de eleição". 30. “ O importante não é o que o mundo faz de você, mas o que você faz com aquilo que o mundo fez de você”. " Uma vez que a liberdade explode no peito de um homem, contra este homem nada mais podem os deuses“ 31. A angústia “ A responsabilidade é um fardo pesado”. A angústia existencial decorre da consciência que “ as escolhas definem o que você é ou se tornará” . Estas escolhas podem afetar, de maneira irreparável, o próprio mundo . A "angústia" decorre da consciência da liberdade e do receio de usá-la de forma errada. 32. É mais fácil acreditar que existe um propósito no universo. Que nossos atos são guiados por uma mão invisível em direção a esse propósito. Neste caso, meus atos não seriam responsabilidade minha, mas apenas o meu papel em um roteiro maior. 33. Para Sartre Não há um propósito ou um destino universal. O homem diante desta constatação se desalenta. O desalento é a constatação de que nada existe fora de nós que define nosso próprio futuro. Apenas nossa liberdade. 34. A má-fé Segundo Sartre, a má-fé é uma defesa contra a angústia e o desalento , uma defesa equivocada. Renunciamos à nossa liberdade escolhendo o que nos afastam do projeto fundamental, atribuindo conformadamente estas escolhas a fatores externos, ao destino , a Deus , aos astros , a um plano sobre humano . Sartre também considerava a idéia freudiana de inconsciente como um exemplo de má-fé. O francês Jean-Paul Sartre estudou na Escola Normal de Paris e em Berlim, onde recebeu a influência de Husserl e Heidegger. Desenvolveu uma filosofia existencialista em obras como O ser e o nada (1943) e O existencialismo é um humanismo (1946). Nela, aprofunda temas como a liberdade humana, a angústia e as paixões. Interessou-se também pelo marxismo, cujo pensamento expressou em Crítica da razão dialética (1960). Em 1945, fundou, com Merleau-Ponty, a revista Lês Temps Modernes e converteu-se em um dos principais teóricos da esquerda. Entre sua produção literária, estão A náusea (1938) e a trilogia "Os caminhos da liberdade", composta de A idade da razão (1945), Sursis (1947) e Com a morte na alma (1949), assim como suas obras de teatro Mortos sem sepultura (1946) e Entre quatro paredes (1945). Em 1964, foi-lhe concedido o prêmio Nobel de Literatura, que ele rejeitou, alegando que nenhum homem poderia ser transformado em instituição. Para Sartre, a liberdade não se resume ao que podemos escolher. Ela se dá pela invenção de possibilidades. Nós podemos inventar nossas opções. Mas isso acontece, sobretudo, quando inventamos a nós mesmos. Se recordarmos John Locke, ele pressupunha que todos nós nascemos vazios, mas com nossas experiências podemos adquirir o conhecimento e, portanto, tornamo-nos alguma coisa. A mais profunda liberdade é poder escolher o que somos e não apenas o que fazemos. Nós escolhemos um projeto para nós mesmos, o que Sartre chama de compromisso. Nós nos comprometemos com nossos valores, gostos, sonhos, desejos e projetos. Sobre o que somos e o que seremos, nós decidimos. A razão disso tudo é a liberdade, que nos permite tornar um tipo de pessoa, voltar atrás ou mudar para outra direção. A liberdade exige cada vez mais liberdade, liberdade de ser o indivíduo que queremos, bons, felizes, tristes, inteligentes, cultos, esportistas, verdadeiros, fingidos, torcedores fanáticos de um time de futebol, mães solteiras etc. Liberdade de escolha - mesmo com limites, a partir da nossa vida, nós decidimos a criação de uma outra vida para nós. Podemos sempre repetir: "Não importa o que fizeram de mim, o que importa é o que eu faço com o que fizeram de mim". Mas ninguém é livre sozinho. Para nos fazermos e refazermos, precisamos de outros com as mesmas possibilidades. É a liberdade dos outros que garante a nossa liberdade. Imagine se ninguém fosse livre a não ser você; seria como um jogo de futebol em que todos os demais jogadores estivessem presos ao chão. Que gosto teria jogar sozinho, sem ter alguém para comemorar ou entristecer-se conosco, partilhando conquistas e derrotas? Quanto mais livres são os outros, mais livres nós somos. Cada um, com sua liberdade, pode inventar a si mesmo e, assim, reinventar o mundo, as cidades, os grupos, lembrando, sempre, que a violência entre os homens começa quando alguém não respeita a liberdade do outro. DESTINO E DETERMINISMO A ideia de destino significa que o homem não pode escolher para onde vai, ou até o que fazer, mesmo que seja contra a sua vontade. Algo fora dele decidirá, e não há nada que ele possa fazer para mudar seu futuro ou alterar seu presente. Essa ideia tem caráter religioso e pode-se dizer que foi introduzida na Filosofia pelos estóicos. Para eles, havia uma causa necessária para tudo, ou seja, o mundo inteiro segue certas leis, as quais obrigam as pessoas a agir e morrer sem poder decidir por si. Essa ideia de causa necessária, posteriormente aplicada à ciência, significa que tudo tem uma causa e um efeito; o destino de tudo já foi decidido pelo seu passado, ou melhor, pela sua causa. A LIBERDADE DE FAZER-SE Sartre e a compreensão da liberdade Segundo Jean-Paul Sartre, a existência precede a essência. Esse princípio da Filosofia existencialista de Sartre quer dizer que os homens não possuem uma essência anterior que revele a sua verdadeira natureza. Ao afirmar que a existência precede a essência, Sartre quis dizer que cada indivíduo está inserido no mundo e o mundo, muito mais do que aspectos naturais, abarca as relações familiares e sociais, relações afetivas e materiais dentro de um determinado contexto histórico. A existência, nesse sentido, depende da conduta que cada um assume em relação aos diferentes fatores que caracterizam o mundo em que vivemos. Dessa forma, os homens são o que fazem no decorrer das suas vidas. Assim, para o existencialismo sartreano, nem a natureza e seus determinismos nem Deus podem explicar de antemão os homens, suas histórias e suas escolhas. Isto porque os homens, pelas suas escolhas, dentro de um determinado contexto de possibilidades, constroem-se a si mesmos. É por intermédio da liberdade de escolha que os homens se fazem. A liberdade de fazer-se significa que a liberdade não é um conceito abstrato, mas uma atitude concreta e identificável, a liberdade é uma característica básica da existência humana e, sendo assim, é preciso assumir a liberdade que nos define ou aprender a ser livre. Admitir a liberdade como base da existência humana significa que devemos atuar no sentido de realizar o nosso projeto de vida, significa não assumir um papel social determinado de antemão por outros, significa, por fim, assumir a responsabilidade pelas escolhas que fazemos e, assim, ser responsável pelo que se é. Sartre com a filósofa e escritora Simone de Beauvoir. Os dois mantiveram um casamento aberto e foram companheiros até a morte dele, em 1980 (Simone faleceu em 1986). Sartre: o ser e o nada Em uma obra ampla, que reúne ensaios, filosofia, teatro e literatura, Sartre defendeu suas teses sobre o ser humano. Seu ponto de partida afirma que o homem vem do nada e é radicalmente livre para fazer a si mesmo. Filosofia, ensaio, literatura Uma das características mais marcantes de Jean-Paul Sartre (l 905-1980) é sua versatilidade com os vários tipos de texto. Ao rigor dos conceitos filosóficos ele aliou o ensaio e a ficção. E foi bem-sucedido em todos esses gêneros. Não se pode, porém, separá-los no conjunto da obra sartreana. Romances, contos, crônicas, crítica literária, jornalismo, análise política e ensaios estão profundamente ligados, na temática, no desenvolvimento das tramas e na composição das personagens, à sua filosofia. São maneiras diferentes de expressar o tema principal da reflexão de Sartre: o homem. Sartre com a filósofa e escritora Simone de Beauvoir. Os dois mantiveram um casamento aberto e foram companheiros até a morte dele, em 1980 (Simone faleceu em 1986). Nessa reflexão, ele retoma a ideia de Martin Heidegger (1889-1976), de que o ser humano vem do nada e se dirige também para o nada. Não há divindade criadora nem "essência" preexistente na origem do homem. Ele vem do nada e somente passa a ser, a existir, quando, já no mundo, começa a fazer-se, a construir-se. É nesse sentido que Sartre entende o homem como "ser para-si": dotado de consciência, ele se percebe (ou seja, ele percebe que "é", que "existe") e por isso pode fazer a si mesmo. E aqui Sartre também resgata outra noção de Heidegger a de que a existência humana é sempre um projeto. Existir é impelir-se na direção do futuro. Consciência, "ser em-si", "ser para-si" A característica mais fundamental do homem, aquilo que o diferencia de outros seres, é a consciência. E a consciência, a princípio, também é nada. É um vazio que começa a ser preenchido quando o ser humano nasce e passa a observar tudo aquilo que há no mundo (os "fenômenos"). O conteúdo da consciência, assim, é composto dos fenômenos que ela percebe na natureza. A consciência - isto é, o ser humano -, porém, faz muito mais do que apenas registrar os objetos do mundo. O homem consegue organizar os fenômenos que observa, dando-lhes um sentido. Ao fazer isso, ele se transforma num co-autor do mundo, que passa a ser aquilo que cada um (e todos, numa perspectiva mais ampla) entende que o mundo seja. A essa capacidade de perceber as coisas, e dar-lhes sentido, Jean-Paul Sartre chama "intencionalidade": a consciência sempre é consciência de algo. O ser humano, que percebe, e os objetos, que são percebidos, mas não podem perceber, são os dois tipos de seres existentes no mundo. O homem, dotado de consciência, é o único capaz de perceber que percebe e de utilizar essa capacidade para decidir o que é, o que fará e como fará. Por isso ele é um "ser para-si". Já os objetos, seres que são percebidos, mas não têm percepção, são "seres em-si": existem, estão no mundo, mas não têm, por princípio, a capacidade de reflexão e a autonomia que a consciência confere aos humanos. Psicanálise existencial A psicanálise existencial, proposta por Jean-Paul Sartre, diferencia-se da freudiana por rejeitar o determinismo como causa de acontecimentos passados. Uma psique que reage à pressão das circunstâncias permite descobrir a estrutura ontológica da escolha originária. O para-si, que é por essência nada, procura abandonar essa condição de origem: deseja ser. Porém, não aspira a um ser na forma do em-si, isto é, uma coisa, um objeto qualquer do mundo. O que o homem quer é converter-se em um em-si que, ao mesmo tempo, seja seu próprio fundamento, ou seja, um em-sí-para-si. Sartre: liberdade radical Condenado a ser livre, o homem é o único responsável por si e por seus atos. Por isso mesmo tem medo e angústia: sente-se sozinho, abandonado no mundo, sem saber o que fazer no instante seguinte. Liberdade e ação A teoria sartreana do ser para-si conduz a uma teoria da liberdade. Isso porque o ser para-si define-se como ação e a primeira condição da ação é a liberdade. O que está na base da existência humana é a livre escolha que cada homem faz de si mesmo e de sua maneira de ser. Desse princípio decorre a afirmação de Jean-Paul Sartre (1905-1980) de que o homem é inteiramente responsável por aquilo que é; não tem sentido querer-se atribuir as falhas individuais a fatores externos como a hereditariedade, a ação do meio, a influência de outras pessoas. A cada momento o ser humano precisa exercer sua liberdade absoluta, refazendo seu eu. É esse o processo de existir, uma relação indeterminada com esse refazer. Isso provoca angústia. Provoca também o medo de realizar as próprias possibilidades; há medo e angústia porque o homem não sabe o que será no momento seguinte. A autonomia da liberdade, como determinação fundamental e radical do ser para-si, faz do existencialismo uma filosofia que prescinde da ideia de Deus. Para Sartre não há nenhum fundamento sobrenatural para os valores: é o homem que os cria. O valor da vida é o sentido que cada homem escolhe para si mesmo. Em síntese, o existencialismo sartreano é uma forma radical de humanismo, suprimindo a necessidade da metafísica e colocando o próprio homem como criador de todos os valores. A má-fé Quando o ser humano se fixa numa personagem de si mesmo, rompendo com o fazer-se contínuo, ele deixa de usar sua liberdade. Cristaliza-se. Essa cristalização, esse parar de fazer-se livremente, tem um nome: má-fé. O ideal perseguido pela má-fé é tornar-se coisa, ser em-si. A má-fé leva à reificação: o ser humano passa a considerar-se algo sólido (como um objeto), definitivo, contrariando a possibilidade do para-si - que é fazer-se - e desagregando a existência, pois desestruturou a liberdade. A conduta de má-fé é a fuga da liberdade. O “ser para - outro” O ser humano convive, no mundo, com outros seres humanos e com objetos. Difere, porém, o modo como se dá a interação com uns e outros. Se, diante de objetos, o homem não tem com que se preocupar, com outros seres humanos a preocupação aparece. O olhar do outro vê os demais como objeto a ser analisado, medido, avaliado, incorporado, anulando-os como sujeitos. Como há resistência, por parte dos seres humanos, a ver-se relegados à condição de objetos, essa objetivação mútua não é capaz de converter o outro em mero em-si. Para escapar da objetivação, é preciso ver o outro como um traço estrutural e originário do para-si: o homem, ao saber aquilo que é, sabe também aquilo que não é (sabe que não é o outro). E pode, então, reconhecer no outro uma consciência, um sujeito como ele, não uma coisa. Liberdade e responsabilidade (...) o homem, estando condenado a ser livre, carrega nos ombros o peso do mundo inteiro: é responsável pelo mundo e por si mesmo enquanto maneira de ser. Tomamos a palavra "responsabilidade" em seu sentido corriqueiro de "consciência (de) ser o autor incontestável de um acontecimento ou de um objeto". (...) Portanto, é insensato pensar em queixar-se, pois nada alheio determinou aqui/o que sentimos, vivemos ou somos. Por outro lado, ta/ responsabilidade absoluta não é resignação: é simples reivindicação lógica das consequências da nossa liberdade. O que acontece comigo, acontece por mim, e eu não poderia me deixar afetar por isso, nem me revoltar, nem me resignar. (...) Sou abandonado no mundo (...) no sentido de que me deparo subitamente sozinho e sem ajuda, comprometido em um mundo pelo qual sou inteiramente responsável, sem poder, por mais que tente, livrar-me um instante sequer desta responsabilidade, pois sou responsável até mesmo pelo meu próprio desejo de livrar-me das responsabilidades (...). JEAN-PAUL SARTRE, O ser e o nada. SITUAÇÃO 4 IMMANUEL KANT AUTONOMIA O objetivo desse texto é desenvolver a capacidade de pensar a autonomia, entendida como uma espécie de legislação particular do indivíduo, ou seja, as normas de conduta que ele cria para si mesmo. Já que todos podemos escolher sempre, é importante fazermos a constante reflexão sobre nossas regras pessoais: Como podemos criá-las e com base em quais critérios? Em todos os lugares, existem sempre muitas normas, disciplinando quase tudo. Algumas delas são escritas e outras já fazem parte do nosso entendimento comum do mundo, ou seja, fazem parte de uma tradição. A escola, por exemplo, está cheia de regras. São normas que vão do uso do boné ao uso do banheiro, sobre a preservação do silêncio quando o professor está falando, que proíbem a “cola” na prova, além de muitas outras. Em casa, também, há muitas regras, como as que disciplinam o uso da TV e do som, as que exigem respeito à limpeza do lar, as que orientam a distribuição de tarefas e responsabilidade domésticas. Até entre os amigos deve haver normas que possam preservar o respeito mutuo e a amizade. As normas são criadas pela influência dos costumes das sociedades ou por quem detém a autoridade. Nem sempre, porém, a tradição, as normas ou a legislação são capazes de nos orientar em nossas escolhas. Autonomia e heteronomia Segundo o Dicionário básico de Filosofia, a palavra autonomia significa liberdade política, autodeterminação e capacidade de governar a si mesmo. De acordo com a Filosofia Kantiana, autonomia “é o caráter da vontade pura que só se determina em virtude de sua própria lei, que é conformar-se ao dever ditado pela razão prática e não por interesse externo”. A heteronomia, ao contrário, significa que a lei a que se obedece é de origem externa. “Em Kant, por oposição à autonomia da vontade, a heteronomia compreende todos os princípios da moralidade aos quais, a vontade deve submeter-se: educação, constituição civil” etc. Dessa forma, a autonomia da vontade se manifesta quando seguimos leis que nós mesmos estabelecemos com base na razão e independente de outras motivações além da própria razão. A heteronomia está atrelada às normas que foram estabelecidas de acordo com as concepções de consciência e bem-estar. Nesse sentido, com base na Filosofia Kantiana, os homens, por serem racionais e viverem em sociedade e segundo normas de convivência, pautam as suas ações pela autonomia da vontade e/ou por heteronomia. Para melhor entendermos sobre a ética Kantiana, vamos fazer a leitura de dois textos a seguir. O texto 1 traz breves considerações sobre como o debate ético está instaurado em nosso cotidiano. O texto 2, é um fragmento em que Kant explica o Imperativo Categórico e o Imperativo hipotético. Texto 1 Um critério para nossas escolhas Em geral, trazemos para questões éticas os grandes debates, tais como o aborto, a pena de morte e a utilização de animais para testes científicos. Esses e outros temas de grande magnitude certamente devem ser tocados pelos debates éticos. Contudo, as ações corriqueiras do nosso cotidiano são reveladoras das nossas crenças e dos nossos critérios de escolha e, portanto, devem ter parte na reflexão ética. A forma de tratar os colegas, os professores, os pais e as pessoas desconhecidas que cruzam o nosso caminho revela os nossos valores e os nossos critérios de ação. Por exemplo: Quando nos deparamos com alguma dificuldade, quais são os nossos critérios para decidir o que fazer? Consideramos critérios individuais ou de solidariedade? Critérios racionais ou emocionais? Para o Filosofo Immanuel Kant, as nossas ações devem ter como critério o dever moral. É o dever moral, fundado na razão, que nos eleva à condição de seres morais, ou seja, que nos permite abrandar o nosso egoísmo, a nossa ambição e a busca desenfreada pelos prazeres. Kant traz as reflexões éticas para a prática, para as ações que demandam escolhas. O poder de tomar decisões no âmbito da vida humana, Kant chama de “arbítrio”. “Imaginemos que um homem cometa um crime, um assassinato. De fato, ele pode tentar se eximir da culpa pelo que fez alegando que foi levado a isso por forças maiores, e que por isso ele ‘não teve escolha’. Pode afirmar, por exemplo, que foi criado num ambiente violento e desumano, ou que foi tomado por uma ira incontrolável naquele momento determinado, ou ainda que ouviu vozes de instâncias sobrenaturais ordenando o ato... É bem possível que essas alegações, se confirmadas, sirvam eventualmente como atenuantes de sua responsabilidade. Mas ele jamais escapará da acusação de que, por ser ele um ser humano e tomar decisões a partir de um arbítrio humano, poderia ter tomado a decisão de resistir a todas as forças, por maiores que fossem, que o ‘conduziram’ ao crime.” Texto 2 Fundamentação da metafísica dos costumes Na natureza, tudo funciona de acordo com certas leis. Somente um ser racional tem a faculdade de agir de acordo com a representação das leis, isto é, de acordo com princípios, ou seja, usando sua vontade. Uma vez que a dedução de ações a partir de princípios demanda razão, a vontade nada mais é do que a razão prática [...] a vontade é a faculdade de escolher aquilo que somente a razão, independente de inclinações, reconhece como algo necessário na prática, ou seja, como algo bom. Porém, se a razão por si só não é suficiente para determinar a vontade, esta estará, por sua vez, sujeita a condições subjetivas (impulsos individuais), que nem sempre coincidem com as condições objetivas em resumo, se a vontade não estiver totalmente de acordo com a razão (o que, em realidade, acontece entre os homens), então as ações, objetivamente reconhecidas como necessárias, são subjetivamente contingentes, e a determinação da vontade de acordo com leis objetivas é uma obrigação [...]. A representação de um princípio objetivo, no sentido de ser obrigatório para uma vontade, é chamada comando (da razão), e a fórmula do comando é chamada imperativo. Todos os imperativos são expressos pelo verbo deve (ou deverá) [...]. Assim, todos os imperativos são ordens hipotéticas ou categóricas. A forma hipotética representa a necessidade prática de uma ação possível como meio para chegar-se a algo que é desejado (ou, pelo menos, algo que pode vir a ser desejado). O imperativo categórico seria aquele representado por uma ação necessária em si, sem referência a outros fins, ou seja, como objetivamente necessária. [...] todos os imperativos são formulas para determinar uma ação que seja necessária de acordo com o princípio da boa vontade, sob certos aspectos. Se, portanto, a ação é boa apenas como meio para se chegar a algo, então o imperativo é hipotético, se for concebida como boa em si mesmo e, consequentemente, como necessária e dentro do princípio de uma vontade ajustada à razão, então ela é categórica. [...] O imperativo categórico que declara uma ação como objetivamente necessária em si mesmo, sem referência a qualquer outro propósito, isto é, sem qualquer outro fim, é válido como um princípio apodítico (prático). Immanuel Kant é um Filosofo que nos ajuda a pensar as questões éticas e a problematizar regras morais. Esse filósofo distinguiu diferentes possibilidades para analisarmos as relações entre vontade, razão e ação. Kant chamou de imperativos os mandamentos da razão que se relacionam com uma vontade. E definiu dois imperativos centrais: imperativo hipotético e imperativo categórico. O imperativo hipotético representa a necessidade de uma ação como meio de alcançar qualquer objetivo que se queira. O imperativo categórico é a ação necessária por si mesma, universal, e, como tal, válida para todos os homens. Essa distinção é interessante para questionarmos nossas ações e nossos princípios morais, sobretudo tomando-se por base esta pergunta: O que considero válido para mim é válido para todos os homens? O Esclarecimento Kantiano Toda a presente dissertação do filósofo moderno Immanuel Kant gira em volta da resposta à pergunta sobre o esclarecimento (aufklärung). Kant começa pelo próprio termo esclarecimento, que «é a saída do homem de sua menoridade». O que produz tal menoridade é o próprio homem, que não consegue sair de sua condição medíocre e tomar coragem de servir-se de si mesmo sem necessitar da ajuda de alheios. A menoridade do homem o afeta em todos os campos: na política, na sociedade, no trabalho, etc. O processo para se sair desse estado de minoridade está no autocontrole e na liberdade que cada indivíduo deve cultivar. Somos convidados a não nos acomodar, a sair em busca do saber, por isso usa o termo latino: Sapere aude! (Ouse saber). Somente através dessa ousadia é que podemos sair de nossa condição. Essa ousadia implica a «coragem de fazer uso de teu próprio entendimento», o que é como que o slogan do esclarecimento. As principais causas que impedem o esclarecimento estão no comodismo, na preguiça e na covardia. Com tais causas, o homem permanecerá sempre em sua menoridade. Para as pessoas acostumadas a ‘receberem as coisas nas mãos’ (Kant enumera alguns: ter um livro que faz as vezes de nosso entendimento; um diretor espiritual que tem consciência em nosso lugar; um método que decide a nossa dieta; etc.), torna-se difícil e perigoso renunciar sua menoridade. Isto está tão enraizado em sua vida, em seu cotidiano, em todos seus trabalhos, que se torna natural, cômodo. Por isso é que os homens não sabem como lidar com a liberdade quando a têm e os impede de utilizar seu entendimento. Mas, para tanto, sempre há uma primeira tentativa, e é essa a exortação de Kant em sua resposta à pergunta proposta. Há pessoas, no entanto, que são o contrário. São aqueles “indivíduos capazes de pensamento próprio”. Esses indivíduos devem espalhar o espírito de avaliação racional de cada homem. Todavia, existem pessoas que acabam tirando proveito da situação, obrigando as demais pessoas a viverem sob seu domínio. A verdadeira revolução deve ser a mudança de pensamento das pessoas. Essa mudança traz benefícios muito maiores que a de uma revolução política, em que apenas se trocam algumas pessoas do poder, mas a dominação continua. Uma revolução assim, que derruba um governo despótico, «nunca produzirá a verdadeira reforma do modo de pensar». O esclarecimento exige liberdade. Uma liberdade não limitada, não condicionada, que favoreça apenas aos que têm o “poder” nas mãos. Também o uso privado da razão, apesar de ser limitado, pode ajudar consideravelmente no progresso do esclarecimento. O uso privado da razão é aquele que o sábio pode fazer em um certo cargo público ou numa função a ele confiada. Um oficial não pode colocar, contra seu superior, seu raciocinar em voz alta. “Deve obedecer.” Entretanto, este mesmo oficial não está impedido de fazer observações sobre os erros no serviço militar. Da mesma forma que um sacerdote, obediente ao credo que professa, diz palavras, em seu sermão, coniventes com o credo professado. Mas, pode e deve, contudo, alertar o público sobre as idéias equivocadas da fé professada. Mesmo a época relatada por Kant é um período apenas de passagem. A época do filósofo não é, ainda, “esclarecida”, mas está em processo de “esclarecimento”. Tal processo é fruto do Iluminismo, tendência de pensamento esclarecido pela luz da razão, e não mais das trevas do Medieval. Portanto, o texto de Kant é essa explicação do esclarecimento. Com ele e nele, temos a ansiedade de buscar, assim como o próprio filósofo, inspirado por Hume, “acordar do sonho dogmático” em que vivemos. Só assim é que o homem se redimirá de sua culpa e sairá de sua tão deplorável menoridade. Prof. Manoelito

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