O objetivo
é desenvolver uma imagem crítica da Ciência, com base no pensamento de Karl
Popper e Thomas Kuhn, desdobrando a questão para tratar de temas como indução e
dedução. Nas primeiras aulas, vamos discutir o problema da indução como base de
verdade; logo após, apresentaremos o chamado falsificacionismo, como
alternativa para tratar do problema da indução, e discutiremos o paradigma de
Kuhn.
Bloco 1: Todos os homens vivos respiram. / Meu
irmão é um homem vivo. / Portanto, meu irmão respira.
Bloco 2: Meu irmão respira. / Meu irmão é um homem vivo. / Portanto, todos os homens vivos
respiram.
No segundo
caso, o argumento não está completo: as duas afirmações (meu irmão respira e
meu irmão é ser vivo) não permitem afirmar de forma generalizada que todos os
homens respiram. O argumento é inválido, porque a conclusão toma por verdade
apenas uma possibilidade: por mais verdadeiras que sejam as inferências, a
conclusão pode não ser verdadeira.
Para
muitos filósofos, na Ciência, a dedução toma o seguinte sentido: temos um
conhecimento teórico e por ele agimos, ou por ele conhecemos outras dimensões
do mundo. Por exemplo, a lei da gravitação Universal de Isaac Newton diz que
todos os corpos se atraem segundo uma força derivada de suas massas e sua
distância. Desse modo, quando um objeto qualquer cai, na verdade, ele foi
atraído pelo planeta. A massa do objeto é atraída pela massa do planeta.
Portanto, ao soltar uma bolsa, ela será atraída pela força gravitacional da
Terra.
Por
dedução, podemos dizer que os objetos, como a bolsa, são atraídos pelo planeta;
por isso, de alguma forma, acreditamos que tudo cai, porque sabemos que há uma
Lei da gravidade e, com base nela, é possível prever um acontecimento. Além
disso, ela é logicamente válida.
A seguir,
vamos refletir sobre a possibilidade de chegar a teorias e leis que valem tanto
para a realidade como para a lógica; desse modo, será possível compreender
melhor o que são indução e dedução.
Indução, ou dados obtidos a
partir de experiências
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O livro de Matemática tem exercícios com frações.
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Criação da lei ou teoria
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Exercícios com frações são difíceis.
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Exercício de dedução
|
Logo, os livros de Matemática são
difíceis, porque têm
exercícios com frações.
|
POR UMA VISÃO CRÍTICA DA CIÊNCIA
O conceito
não crítico de Ciência, isto é, aquele que se utiliza da indução.
ü
Com
base na observação de grande número de experiências, por meio dos cinco
sentidos, cria-se uma lei ou uma teoria;
ü
Ao
se repetirem as condições enunciadas nessa lei, pode-se prever um acontecimento.
ü
Isso
garantiria a objetividade do conhecimento científico, isto é, ele não
dependeria da opinião das pessoas, mas poderia ser comprovado por todos os
seres humanos.
ü
Com
a indução, parte-se do particular para o universal; esse conceito utiliza a
generalização para criar leis e teorias científicas.
ü
Com
as leis e as teorias científicas, é possível, por meio da dedução, prever e
explicar acontecimentos.
A Ciência
é uma atividade racional e, por isso, vale-se das regras da lógica para
fundamentar seus conhecimentos. No entanto, a indução não parte das regras
lógicas para se legitimar. Ela parte da experiência. A experiência pode parecer
racional, mas não é, pois está envolvida com os sentidos, e não com o
raciocínio.
Leiam o texto a seguir e analisem
como David Hume propôs o problema
“Parte II 28. Mas nós ainda não
atingimos algo minimamente satisfatório com relação à questão primeiramente
proposta. Cada solução ainda levanta uma nova questão tão difícil quanto a que
a precede, e nos leva a mais questionamentos. Quando se pergunta, qual a
natureza de todos nossos argumentos com relação a fatos reais? A resposta
adequada parece ser a que eles são baseados na relação de causa e efeito.
Quando novamente se pergunta, qual a fundamentação de todos os nossos
argumentos e conclusões referentes a tal relação? Pode-se responder em uma só
palavra: experiência. Mas se ainda quisermos dar continuidade a nosso humor
investigativo, e perguntarmos. Qual a fundamentação de todas as conclusões
baseadas na experiência? Isso implicaria uma nova questão, que pode ser de mais
difícil solução e explicação. Filósofos, que se dão ares de sabedoria e
suficiência superiores, têm uma árdua tarefa quando encontram pessoas com
disposição investigativa, que os empurram para fora de todos os cantos em que
se recolhem, e que certamente trazem a eles algum dilema perigoso. O melhor
expediente para prevenir essa confusão é sermos modestos em nossas pretensões;
e até mesmo descobrir a dificuldade nós mesmos antes de esta nos ser
direcionada. Desse modo, podemos fazer de nossa ignorância uma espécie de mérito.
” HUME,
David. An enquiry concerning human understanding. Essays and treatises on
several subjects. p. 42. Disponível
em: <http://goo.gl/b6NXkl>. Acesso em: 29 out. 2013. tradução Eloisa
Pires.
Vamos
rever o que é a indução, agora com um exemplo dado por Bertrand Russell.
“Certo peru foi alimentado, durante
um ano, às 9 horas (dado). Ele criou, então, uma lei: sou alimentado todos os
dias às 9 horas (teoria). Amanhã, às 9
horas, serei alimentado (previsão).
No entanto, houve um problema com a
previsão do peru, pois, no dia seguinte à sua previsão, ele foi degolado porque
era véspera de Natal e ele seria servido na ceia. ”
Por que a
previsão do peru falhou? Porque leis e teorias são questionáveis, nada na
natureza tem o dever de seguir nossas leis científicas. Por isso, se um dia o
Sol se puser e, no outro, não amanhecer, o que impediria a ocorrência? Ora, as
leis da natureza são as interpretações que fazemos dela. Cada princípio
científico pode ser contrariado pela natureza porque não é fundamentado pela
razão, mas pela experiência. Nós prevemos alguns eventos como se fosse um
hábito psicológico. Por exemplo, o que garante que, ao soltar um lápis, ele vai
cair? A Lógica não pode garantir isso; afinal, ela trata de palavras e
conhecimentos, e nunca da realidade. A experiência é sempre única, e a queda de
um lápis não tem relação com a queda de outro. Em resumo, nada garante que o
lápis vá cair. Por isso, quando consideramos a Ciência como uma garantia da
verdade, temos uma visão acrítica dela. Há, ainda, dois outros problemas que
precisamos discutir a respeito da indução, como fundamento da Ciência. São
eles:
ü
A
observação como fonte objetiva; e A
relação teoria-experiência.
Afirma-se,
constantemente, que da observação das experiências tiramos os conhecimentos.
Mas será que cada um de nós observa da mesma maneira? Será que nossa visão, nossa
audição, nosso paladar, nosso tato e nosso olfato são iguais aos dos outros
seres humanos? As pessoas podem observar uma mesma situação de modos
diferentes.
Quais são
os limites da observação? As percepções que vêm dos sentidos não são as mesmas
para todos, já que as pessoas podem observar uma mesma situação de formas
diferentes.
Enfim, a
observação tem problemas em relação à objetividade da Ciência, e também com a
crença de que dela derivam todas as teorias. Seria muito difícil acreditar que,
quando um cientista realiza uma experiência, ele o faça partindo do nada. Ele
tem muitas teorias anteriores à experiência, e, algumas vezes, é com base nelas
que ele irá produzir a própria experiência a ser observada. Isso aparece
principalmente quando, durante a observação, o cientista usa o vocabulário de
uma teoria para expressar sua percepção. Por exemplo, para explicar a
experiência de um livro que foi solto no solo, um físico poderia dizer, em sua
observação, que a força gravitacional da massa do planeta Terra é que atraiu
para ele, segundo sua distância, a massa do livro. Onde está a palavra “força”
no ato de soltar um livro? E “atração”? Todas essas palavras estão na mente do
cientista antes da experiência.
Na vida
cotidiana, podemos encontrar vários exemplos de percepções com vocabulário
derivado de outras teorias. Por exemplo, se dissermos: “o vento empurrou o lixo
para dentro da sala”, já apresentamos teorias. Inicialmente, que o lixo pode
ser empurrado, e que o ato de ele entrar na sala foi em função de algo externo,
uma vez que não seria capaz de entrar na sala sozinho: temos, aqui, uma teoria
da inércia do lixo. Segundo, mesmo sem podermos ver, sabemos que o vento é
capaz de movimentar outras coisas: temos, aqui, uma teoria da capacidade de o
vento empurrar. Se, no cotidiano, temos teorias, seria absurdo imaginar que os
cientistas gastariam montanhas de dinheiro para fazer pesquisas sem uma teoria
prévia do que eles pretendem experimentar.
Como
exemplo, observem pequenos fenômenos na sala de aula. Os fenômenos, como “o Sol
atravessa o vidro e aquece a carteira”. Percebam as pequenas teorias que acompanham
essa afirmação. Por exemplo, o Sol é quente e emite raios de calor; o vidro é
transparente e permite a passagem de calor e de luz; a carteira recebe calor e
fica aquecida. Assim, por meio da percepção, do vocabulário de outras teorias e
de inferências, é possível elaborar pequenas teorias. Nesse contexto, podemos
afirmar que a Ciência é uma atividade humana que contempla, entre outros
procedimentos, observações, interpretações e análises de fenômenos (no exemplo mencionado,
os raios solares incidem verticalmente sobre um material sólido e transparente,
atravessando-o e incidindo sobre objetos).
O falsificacionismo, Karl Popper
Depois de
termos visto alguns problemas sobre a indução, vamos estudar agora alguns
filósofos que reconheceram a importância da atividade científica. Embora
admita-se que ela não é capaz de dar todas as respostas e se entenda que é
baseada na indução, acreditamos que, ainda assim, a Ciência oferece as melhores
respostas disponíveis.
Para os
falsificacionistas – entre os quais Karl Popper é um dos mais importantes –, o
valor de um conhecimento científico não vem da observação de experiências, mas
da possibilidade de a teoria ser contrariada, ou melhor, falseada. Em um
primeiro momento, acreditava-se que a Ciência comportaria todas as verdades,
com base na criação de teorias e leis que surgiriam pela observação de
experiências – essa é a crença de indutivistas. Com a ideia de que a teoria
precede a experiência, os falsificacionistas admitem que toda explicação
científica é hipotética; no entanto, é o melhor que temos.
Quanto
mais uma teoria pode ser falseada, melhor seria ela. Por exemplo, ignorando a
pressão atmosférica e outros fatores, se dissermos que “a água ferve a 100
graus Celsius”, qual é a contradição possível, ou melhor, o que tornaria falsa
essa afirmação? A resposta seria: ao chegar a 100 graus Celsius, a água não
ferveria, ou ferveria antes. No momento em que uma teoria é falseada, o
cientista tentará melhorá-la ou a abandonará. Mas, enquanto ela não é falseada,
permanece seu valor explicativo. O fundamental é que tenhamos em mente o seu
limite. As teorias têm de dizer algo bem objetivo sobre o mundo, para sermos
capazes de conceber sua falsificabilidade.
Critérios para uma boa teoria
ü
Tem
de ser clara e precisa, não pode ser obscura nem deixar margem para várias
interpretações. Quanto mais específica, melhor;
ü
Deve
permitir a falsificabilidade; quanto mais, melhor;
ü
Deve
ser ousada, para conseguir progredir em busca de um conhecimento mais
aprofundado sobre a realidade.
Teorias
que não podem ser falseadas não são boas teorias. Por exemplo, se alguém disser
que “o ladrão rouba”, não estará dizendo muita coisa sobre o mundo. Apesar de
parecer clara, essa afirmação não pode ser falseada; afinal, está contida na
palavra “ladrão” a ideia de que ela qualifica os seres que roubam. Ninguém
precisa dizer “o ladrão rouba” para sabermos que ele rouba. É impossível
contradizer essa afirmação, pois é completamente irracional pensarmos em um
ladrão que não rouba.
Outro
exemplo: se dissermos “é possível ter sorte no esporte”, também não diremos
muita coisa. Não estamos sendo precisos, uma vez que muitas outras coisas são
possíveis no esporte. A própria ideia de que algo é possível permite quase
tudo, mas como medir a sorte ou saber que não foi o acaso? Essa frase serve
tanto para perder quanto para ganhar, não é capaz de ser falseada. Pode ser a
sorte de um time ou de outro; pode ser até mesmo a sorte dos dois, mas nunca
deixará de ser sorte de alguém.
O progresso da
ciência
Para os
falsificacionistas, a Ciência progride pela tentativa de superação das teorias.
Com base nas considerações de Alan Chalmers, no livro O que é Ciência afinal? Podemos
pensar o progresso da Física segundo os falsificacionistas.
O primeiro
grande físico seria o filósofo Aristóteles. Sua teoria explicava por que os
objetos caíam (para encontrar seu lugar natural) ou, também, como funcionava o
sifão (a impossibilidade do vácuo). A física de Aristóteles foi falseada várias
vezes. A física de Newton era capaz de explicar melhor do que a física de
Aristóteles diversos fenômenos; por exemplo, a lei da gravidade era melhor que
a teoria da Posição Natural, esta refutada há bastante tempo. No entanto, a
física de Newton não explicava alguns fenômenos, como a órbita do planeta
Mercúrio. A física de Albert Einstein, por sua vez, era capaz de explicar não
só os pontos em que a física de Newton era bem-sucedida, como o que foi refutado
dessa teoria. Agora, os cientistas procuram ir além. A teoria de Einstein é
melhor que a de Aristóteles e que a de Newton; no entanto, apesar de ser a
melhor disponível, poderá ser superada um dia, pois o melhor que temos não é o
definitivo.
O não científico na
ciência
Muitos
filósofos se interessaram em pensar de forma crítica a Ciência, seus
fundamentos, seus limites e seu progresso. Agora, vamos discutir a reflexão de
Thomas Kuhn a respeito da Ciência, vista por ele como uma construção histórica.
Em primeiro lugar, é importante salientar que a Ciência é uma atividade
racional e humana. Como muitas outras, é influenciada por problemas humanos de
natureza variada, como emocionais, políticos, linguísticos, sociais e
religiosos.
Kuhn
percebeu que essas influências são inerentes à racionalidade humana e se propôs
a pensar a Ciência com base nelas e de acordo com a seguinte linha de
desenvolvimento: 1. Pré-Ciência, 2. Ciência
normal, 3. Crise, 4. Revolução científica e 5. Nova Ciência normal. O conceito mais importante para Kuhn é o de
paradigma, que é o modelo da Ciência normal. Durante um tempo, todos os
cientistas procuram orientar suas pesquisas com base em um modelo, de maneira a
preservar a verdade científica. O que não se encaixar nesse modelo será excluído;
será considerado anomalia, mas isso também pode indicar que o cientista não
aplicou corretamente o modelo e sua metodologia. Para Kuhn, o determinante das
normas da Ciência é o paradigma aceito pelos cientistas. Mas, por motivos nem
sempre racionais, os cientistas mudam de paradigma, após uma crise da Ciência
normal, o que, em geral, é fundamentado na anomalia, isto é, quando a Ciência
normal não consegue responder a alguns problemas, como a órbita de Mercúrio
para a física newtoniana.
Essa crise
estende-se até uma revolução científica, quando a maneira de fazer Ciência muda
completamente. Quando ocorre essa mudança, segundo Kuhn, chega-se a uma nova
Ciência normal, praticada, a partir desse momento, de acordo com um novo
paradigma.
É preciso
considerar que a racionalidade científica encontra problemas dentro e fora de
seu espaço de ação. Dentro desse espaço são as anomalias e, fora dele, são as
necessidades humanas da pesquisa científica. Instituições, empresas e governos
procuram fazer que a Ciência seja orientada por seus interesses, não apenas por
mera curiosidade.
Com base no texto, responda as seguintes
questões:
1.
Qual
é a natureza de todos os nossos raciocínios sobre os fatos, segundo Hume?
2.
De
acordo com Hume, qual é o fundamento de todos os nossos raciocínios e
conclusões sobre a relação de causa e efeito?
3.
Por
que Hume vê um problema na fundamentação das conclusões por meio da observação
da experiência?
4.
Para
muitos filósofos, na Ciência, que sentido a dedução toma?
5.
Por
que a previsão do peru falhou?
6.
Quais
são os problemas que precisamos discutir a respeito da indução, como fundamento
da Ciência.
7.
Por
que as percepções que vêm dos sentidos não são as mesmas para todos?
8.
Os
fenômenos, como “o Sol atravessa o vidro e aquece a carteira”. Nesse contexto, o
que podemos afirmar?
9.
Para
os falsificacionistas, entre os quais Karl Popper é um dos mais importantes, de
onde vem o valor de um conhecimento científico?
10.
Para
os falsificacionistas, quais são os critérios para uma boa teoria cientifica?
11.
Para
os falsificacionistas, como a Ciência progride?
12.
Explique
a linha de desenvolvimento da ciência proposta por Thomas Kuhn.
13.
O
que é um paradigma, segundo Thomas Kuhn?
14.
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vida e obras de Karl Popper, Thomas Kuhn, David Hume e as expressões:
“Ciência”, “termo científico”, “Hipótese”, “tese”, “Indução” e “Dedução”.
PROF.
MANOELITO
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