A palavra filosofia é grega. É composta por duas
outras: philo e sophia. Philo deriva-se de philia, que significa amizade, amor
fraterno, respeito entre os iguais. Sophia quer dizer sabedoria e dela vem a
palavra sophos, sábio.
Filosofia significa, portanto, amizade pela sabedoria,
amor e respeito pelo saber. Filósofo: o que ama a sabedoria, tem amizade pelo
saber, deseja saber. Assim, filosofia indica um estado de espírito, o da pessoa
que ama, isto é, deseja o conhecimento, o estima, o procura e o respeita.
Atribui-se ao filósofo grego Pitágoras de Samos (que
viveu no século V antes de Cristo) a invenção da palavra filosofia. Pitágoras
teria afirmado que a sabedoria plena e completa pertence aos deuses, mas que os
homens podem desejá-la ou amá-la, tornando-se filósofos.
A Filosofia é
grega - A Filosofia, entendida como aspiração
ao conhecimento racional, lógico e sistemático da realidade natural e humana,
da origem e causas do mundo e de suas transformações, da origem e causas das
ações humanas e do próprio pensamento, é um fato tipicamente grego. Quando
se diz que a Filosofia é um fato grego, o que se quer dizer é que ela possui
certas características, apresenta certas formas de pensar e de exprimir os pensamentos,
estabelece certas concepções sobre o que sejam a realidade, o pensamento, a
ação, as técnicas, que são completamente diferentes das características
desenvolvidas por outros povos e outras culturas.
Filosofia é um modo de pensar e exprimir os
pensamentos que surgiu especificamente com os gregos e que, por razões
históricas e políticas, tornou-se, depois, o modo de pensar e de se exprimir
predominante da chamada cultura europeia ocidental da qual, em decorrência da
colonização portuguesa do Brasil, nós também participamos. Através da
Filosofia, os gregos instituíram para o Ocidente europeu as bases e os princípios
fundamentais do que chamamos razão, racionalidade, ciência, ética, política,
técnica, arte.
Por causa da colonização europeia das Américas, nós
também fazemos parte, ainda que de modo inferiorizado e colonizado, do Ocidente
europeu e assim também somos herdeiros do legado que a Filosofia grega deixou
para o pensamento ocidental europeu.
A Filosofia surge, portanto, quando alguns gregos,
admirados e espantados com a realidade, insatisfeitos com as explicações que a
tradição lhes dera, começaram a fazer perguntas e buscar respostas para elas,
demonstrando que o mundo e os seres humanos, os acontecimentos e as coisas da
Natureza, os acontecimentos e as ações humanas podem ser conhecidos pela razão
humana, e que a própria razão é capaz de conhecer-se a si mesma.
Em suma, a Filosofia surge quando se descobriu que a
verdade do mundo e dos humanos não era algo secreto e misterioso, que precisasse
ser revelado por divindades a alguns escolhidos, mas que, ao contrário, podia
ser conhecida por todos, através da razão, que é a mesma em todos; quando se
descobriu que tal conhecimento depende do uso correto da razão ou do pensamento
e que, além da verdade poder ser conhecida por todos, podia, pelo mesmo motivo,
ser ensinada ou transmitida a todos.
O que
perguntavam os primeiros filósofos: Por que nada
permanece idêntico a si mesmo? De onde vêm os seres? Para onde vão, quando
desaparecem? Por que se transformam? Por que se diferenciam uns dos outros? Mas
também, por que tudo parece repetir-se? Depois do dia, a noite; depois da
noite, o dia. Depois do inverno, a primavera, depois da primavera, o verão,
depois deste, o outono e depois deste, novamente o inverno. De dia, o sol; à
noite, a lua e as estrelas. Na primavera, o mar é tranquilo e propício à navegação;
no inverno, tempestuoso e inimigo dos homens. O calor leva as águas para o céu
e as traz de volta pelas chuvas. Ninguém nasce adulto ou velho, mas sempre
criança, que se torna adulto e velho.
Foram perguntas como essas que os primeiros filósofos
fizeram e para elas buscaram respostas. Sem dúvida, a religião, as tradições e
os mitos explicavam todas essas coisas, mas suas explicações já não satisfaziam
aos que interrogavam sobre as causas da mudança, da permanência, da repetição,
da desaparição e do ressurgimento de todos os seres. Haviam perdido força
explicativa, não convenciam nem satisfaziam a quem desejava conhecer a verdade
sobre o mundo.
O nascimento da
Filosofia: Os historiadores da Filosofia dizem que
ela possui data e local de nascimento:
final do século VII e início do século VI antes de
Cristo, nas colônias gregas da Ásia Menor (particularmente as que formavam uma
região denominada Jônia), na cidade de Mileto. E o primeiro filósofo foi Tales
de Mileto.
Além de possuir data e local de nascimento e de
possuir seu primeiro autor, a Filosofia também possui um conteúdo preciso ao
nascer: é uma cosmologia. A palavra cosmologia é composta de duas outras:
cosmos, que significa mundo ordenado e organizado, e logia, que vem da palavra
logos, que significa pensamento racional, discurso racional, conhecimento.
Assim, a Filosofia nasce como conhecimento racional da ordem do mundo ou da
Natureza.
Mito e Filosofia
- A Filosofia nasceu realizando uma transformação
gradual sobre os mitos gregos ou nasceu por uma ruptura radical com os mitos?
O que é um mito? Um mito é uma narrativa sobre a
origem de alguma coisa (origem dos astros, da Terra, dos homens, das plantas,
dos animais, do fogo, da água, dos ventos, do bem e do mal, da saúde e da
doença, da morte, dos instrumentos de trabalho, das raças, das guerras, do
poder, etc.).
A palavra mito vem do grego, mythos, e deriva de dois
verbos: do verbo mytheyo (contar, narrar, falar alguma coisa para outros) e do
verbo mytheo (conversar, contar, anunciar, nomear, designar). Para os gregos,
mito é um discurso pronunciado ou proferido para ouvintes que recebem como
verdadeira a narrativa, porque confiam naquele que narra; é uma narrativa feita
em público, baseada, portanto, na autoridade e confiabilidade da pessoa do
narrador. E essa autoridade vem do fato de que ele ou testemunhou diretamente o
que está narrando ou recebeu a narrativa de quem testemunhou os acontecimentos narrados.
O mito narra a origem das coisas por meio de lutas,
alianças e relações sexuais entre forças sobrenaturais que governam o mundo e o
destino dos homens. Como os mitos sobre a origem do mundo são genealogias,
diz-se que são cosmogonias e teogonias.
A palavra gonia vem de duas palavras gregas: do verbo
gennao (engendrar, gerar, fazer nascer e crescer) e do substantivo genos
(nascimento, gênese, descendência, gênero, espécie). Gonia, portanto, quer
dizer: geração, nascimento a partir da concepção sexual e do parto. Cosmos,
como já vimos, quer dizer mundo ordenado e organizado. Assim, a cosmogonia é a
narrativa sobre o nascimento e a organização do mundo, a partir de forças
geradoras (pai e mãe) divinas.
Teogonia é uma palavra composta de gonia e theós, que,
em grego, significa: as coisas divinas, os seres divinos, os deuses. A teogonia
é, portanto, a narrativa da origem dos deuses, a partir de seus pais e
antepassados.
Condições
históricas para o surgimento da Filosofia
O que tornou possível o surgimento da Filosofia na
Grécia no final do século VII e no início do século VI antes de Cristo? Quais
as condições materiais, isto é, econômicas, sociais, políticas e históricas que
permitiram o surgimento da Filosofia? Podemos apontar como principais condições
históricas para o surgimento da Filosofia na Grécia:
Ø As viagens marítimas,
que permitiram aos gregos descobrir que os locais que os mitos diziam habitados
por deuses, titãs e heróis eram, na verdade, habitados por outros seres
humanos; e que as regiões dos mares que os mitos diziam habitados por monstros
e seres fabulosos não possuíam nem monstros nem seres fabulosos. As viagens
produziram o desencantamento ou a desmistificação do mundo, que passou, assim,
a exigir uma explicação sobre sua origem, explicação que o mito já não podia
oferecer;
Ø A invenção do calendário,
que é uma forma de calcular o tempo segundo as estações do ano, as horas do
dia, os fatos importantes que se repetem, revelando, com isso, uma capacidade
de abstração nova, ou uma percepção do tempo como algo natural e não como um
poder divino incompreensível;
Ø A invenção da moeda,
que permitiu uma forma de troca que não se realiza através das coisas concretas
ou dos objetos concretos trocados por semelhança, mas uma troca abstrata, uma
troca feita pelo cálculo do valor semelhante das coisas diferentes, revelando,
portanto, uma nova capacidade de abstração e de generalização;
Ø O surgimento da vida urbana,
com predomínio do comércio e do artesanato, dando desenvolvimento a técnicas de
fabricação e de troca, e diminuindo o prestígio das famílias da aristocracia
proprietária de terras, por quem e para quem os mitos foram criados; além
disso, o surgimento de uma classe de comerciantes ricos, que precisava
encontrar pontos de poder e de prestígio para suplantar o velho poderio da
aristocracia de terras e de sangue (as linhagens constituídas pelas famílias),
fez com que se procurasse o prestígio pelo patrocínio e estímulo às artes, às
técnicas e aos conhecimentos, favorecendo um ambiente onde a Filosofia poderia
surgir;
Ø A invenção da escrita alfabética,
que, como a do calendário e a da moeda, revela o crescimento da capacidade de
abstração e de generalização, uma vez que a escrita alfabética ou fonética,
diferentemente de outras escritas - como, por exemplo, os hieróglifos dos
egípcios ou os ideogramas dos chineses -, supõe que não se represente uma
imagem da coisa que está sendo dita, mas a idéia dela, o que dela se pensa e se
transcreve;
Ø A invenção da política,
que introduz três aspectos novos e decisivos para o nascimento da Filosofia:
1. A
ideia da lei como expressão da vontade de uma coletividade humana que decide
por si mesma o que é melhor para si e como ela definirá suas relações internas.
O aspecto legislado e regulado da cidade - da polis - servirá de modelo para a
Filosofia propor o aspecto legislado, regulado e ordenado do mundo como um
mundo racional.
2. O
surgimento de um espaço público, que faz aparecer um novo tipo de palavra ou de
discurso, diferente daquele que era proferido pelo mito. Neste, um poeta vidente,
que recebia das deusas ligadas à memória (a deusa Mnemosyne, mãe das Musas, que
guiavam o poeta) uma iluminação misteriosa ou uma revelação sobrenatural, dizia
aos homens quais eram as decisões dos deuses que eles deveriam obedecer.
Agora,
com a polis, isto é, a cidade política, surge a palavra como direito de cada cidadão
de emitir em público sua opinião, discuti-la com os outros, persuadi-los a tomar
uma decisão proposta por ele, de tal modo que surge o discurso político como a
palavra humana compartilhada, como diálogo, discussão e deliberação humana,
isto é, como decisão racional e exposição dos motivos ou das razões para fazer
ou não fazer alguma coisa.
A
política, valorizando o humano, o pensamento, a discussão, a persuasão e a decisão
racional, valorizou o pensamento racional e criou condições para que surgisse o
discurso ou a palavra filosófica.
3. A
política estimula um pensamento e um discurso que não procuram ser formulados
por seitas secretas dos iniciados em mistérios sagrados, mas que procuram, ao
contrário, ser públicos, ensinados, transmitidos, comunicados e discutidos. A ideia
de um pensamento que todos podem compreender e discutir, que todos podem
comunicar e transmitir, é fundamental para a Filosofia.
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